OAB: culpados pela reprovação em massa

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP e Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

GOMES, Luiz Flávio. OAB: culpados pela reprovação em massa. Disponível em http://www.lfg.com.br.08 junho. 2009.

O diploma de bacharel em Direito (no Brasil) já não significa a plena garantia de emprego ou mesmo o exercício efetivo de uma profissão. O primeiro obstáculo com o qual se depara esse bacharel é o exame de ordem (da OAB) que, embora absolutamente necessário, é visto cada vez mais como o grande vilão da empregabilidade (ou profissionalização) do diplomado, que não pode nunca subscrever a visão pouco otimista (mas em certo sentido realista) de Eugênio Mohallem (brasileiro, publicitário), que disse: "Diploma universitário: aquilo que não serve para nada e ainda faz você perder a carteirinha de estudante".

Os últimos exames da OAB estão revelando baixos índices de aprovação (cerca de 19% é a média de êxito). Na prova nacional (Cespe) do dia 17.05.09 apenas 20% dos candidatos foram aprovados na primeira fase. Isso significa que o índice nacional final ficará em torno de 12 ou 13%. De quem é a culpa?

A OAB culpa as Faculdades e o MEC (ela censura a grande quantidade de faculdades no país, o baixo nível de ensino, a falta de comprometimento com o aluno, a má remuneração dos professores, a falta de fiscalização do MEC, que aprova uma nova faculdade todos os dias etc.); as Faculdades, por seu turno, culpam o aluno, que seria analfabeto ou de baixo nível de escolaridade, que não se interessa pelo que é ensinado, que o sistema educativo brasileiro é precário, que o consumismo é exagerado, que a televisão é um lixo etc.

O aluno, por sua vez, culpa tanto a Faculdade (baixo nível dos professores, método de ensino ultrapassado etc.) como a própria OAB (proposital dificuldade do exame de ordem, elitismo, reserva de mercado etc.) e os professores; os professores culpam as faculdades (pelos baixos salários, pela falta de incentivo etc.) assim como a OAB (que exige nas provas assuntos irrelevantes etc.) e os alunos (despreparados, analfabetos etc.); a mídia insinua que a culpa seria das faculdades, estas culpam o consumismo, os "orkuts", a televisão etc. Como se vê, sempre procuramos culpar o outro (ou os outros).

É chegado o momento, no entanto, de não mais perguntarmos de quem é a culpa (porque todos os citados possuem sua cota neste insucesso). É chegada a hora de assumir nossas responsabilidades. Somar forças para formar um círculo virtuoso: esse nos parece o caminho correto. Recordemos: "Cada vez que pensamos que o problema não é nosso, essa atitude é o problema" (Stephen R. Covey, americano, empresário e escritor).

O problema, na verdade, não é a quantidade de faculdades (apenas 12% dos brasileiros estão fazendo curso superior), sim, a qualidade. Parece oportuno sublinhar que o ensino jurídico no Brasil se acha submetido a pelo menos cinco crises que ocupam o centro da questão da empregabilidade ou profissionalização do diplomado nessa área.

São elas: (a) científico-ideológica (ensino do modelo legalista de direito do século XIX, ignorando os novos paradigmas constitucionalista e internacionalista), (b) institucional (as faculdades não estariam cumprindo bem o seu papel de proporcionar um aprendizado efetivo), (c) metodológica (falta do learning doing: aprender fazendo), (d) pedagógica (ausência de motivação) e (e) estratégica-curricular.

No que diz respeito a essa última crise cabe ponderar o seguinte: a grade curricular das faculdades de direito são (praticamente) todas programadas para ensinar o conteúdo demarcado em dez semestres. O erro está em não programar o último semestre para uma revisão geral de tudo que foi ministrado ao longo do curso.

Durante os primeiros nove semestres do curso de direito (quatro anos e meio) muitas leis são ensinadas, enorme jurisprudência é passada etc. Ocorre que, no Brasil, as leis mudam todo dia! De 1988 a 2009 foram mais de três milhões de normas novas (cf. blogdolfg.com.br). A jurisprudência muda a cada hora! E ela também é fonte do direito. Noções ou lições que o aluno aprendeu nos primeiros semestres foram esquecidas. Muitos conceitos não foram bem assimilados. É preciso atualizar esse aluno, mostrar o que foi mudado na lei e na jurisprudência, interna e internacional. É preciso colocá-lo a par do conteúdo dos tratados de direitos humanos. Como se esperar bons resultados no exame da OAB e no ENADE se o aluno não foi devidamente atualizado?

O décimo período da faculdade de direito tem que ser totalmente reprogramado. Ele revela o momento de atualização, de recordação, de aquisição de técnicas específicas adotadas no exame de ordem, no enade etc. Ainda são poucas (praticamente nenhuma, talvez) as faculdades que estão afinadas com essa nova e revolucionária estratégia-curricular. Se "A necessidade é a mãe da invenção" [ou da reinvenção], como dizia Platão (grego, 428-347 a.C., filósofo), é momento de se mexer. Ou nos reinventamos continuamente, ou perecemos! A mudança contínua deve ser a única coisa permanente (constante) em nossa vida.

De acordo com nossa opinião parece incorreto afirmar que a culpa do insucesso educacional e profissional do diplomado na área jurídica seja exclusiva do MEC, das Faculdades, do aluno, dos professores ou da própria OAB. A reduzida empregabilidade (e profissionalização) nesse setor é multifatorial e conta com vários culpados. Mas falar em culpados significa olhar o passado (ou seja: significa um olhar retrospectivo). A questão da empregabilidade ou profissionalização, entretanto, exige uma visão prospectiva, que conduza indefectivelmente a afirmar que investir seriamente em educação (na própria ou na de toda população de um país) é a estratégia mais inteligente que se pode adotar.

Pesquisas recentes (Ibope) revelam que a educação, para os escolarizados, é a quinta preocupação do brasileiro; para os de baixa escolaridade essa preocupação ocupa a sétima posição (Saúde, Emprego, Fome/Miséria, Segurança, Corrupção e Drogas são as anteriores). Os que mais precisam da educação são os que menos se preocupam com ela! Apesar da revelação do Ibope, é preciso insistir: nenhum país pode prosperar sem educação! "O que a escultura é para o bloco de mármore, a educação é para o espírito" (Joseph Addison, inglês, 1672-1719, poeta e dramaturgo). E "Se você acha que a educação é cara, tente a ignorância" (Derek Bok, americano, 1930-, professor e escritor).

12 comentários:

Anônimo,  27 de outubro de 2009 às 08:13  

Uma situação que não foi mencionada no texto é a arcaica monografia. Como estou no 10º período sei bem o que é isso. A minha faculdade ao invés de fazer como o professor Luiz Flávio Gomes propõe "uma revisão", ficam preocupados em se portarem como "juízes", sim, isso mesmo, pois este é o que representam na hora de uma banca de monofrafia, só que dificilmente alguém vai levar adiante o projeto de monografia ou seja, poucos transformam esse tipo de pesquisa numa tese de mestrado. Sem falar no enorme número de pessoas que compram a monografia pronta. Outro ponto é a visualização do processo, que na minha faculdade só aconteceu no 6º período, um absurdo. Enfim, por que as faculdades ao invés de focarem na ultrapassada monografia não exercitam os alunos na prática das peças, posto que fingem dar a prática processual, com modelos de peças já prontos não levam ao raciocínio jurídico.

Daniele,  27 de outubro de 2009 às 08:43  

Eu acredito que tanto a OAB quanto as faculdades não estão erradas. A Faculdade tem a opção de se manter de maneira precaria e a OAB tem a obrigação de filtrar quem é mais "copetente" para fazer parte de seu quadro. O que eu não concordo é que a OAB cobre um valor absurdo para se realizar uma prova. Já que o exame é tão dificil, porque cobrar um valor tão alto para se realizar a prova, seria isso tambem uma maneira de filtrar as pessoas "Aptas" à advogar. Isso sim eu acho um absurdo, pois desde que me formei (ha 2 anos) só consegui fazer 2 provas, por falta de grana mesmo na hora de realiza-la. Minha renda toda (mesmo depois de formada não consigo um emprego e um salario melhor) vai para casa, como já ia antes, durante a faculdade, e ficar pagando, 3 vezes por ano (são R$ 600) para tentar passar na prova já é uma maneira de selecionar aqueles que são "aptos" à advogar. A OAB deveria pensar nesse valor absurdo tambem. Da mesma maneira que eles culpam as faculadades de serem mercantilistas, eles tambem estão sendo quando cobram esse valor absurdo na inscrição para prova, sendo que não para por ai, depois que voce passa ainda tem a anuidade que é a mais cara entre os registros de classe (em comparação à outras classes).

Anônimo,  27 de outubro de 2009 às 12:55  

Vários são os motivos de reprovaçao.
A prova é unificada, mas o valor para fazer a prova não é porque o em São Paulo o valor é de R$ 180,00 e em Rondônia o valor é de R$ 250,00. Então vamor procurar estudar muito, muito, muito porque ficar dando dinheiro para a OAB não é certeza para empregabilidade, ou fazer poupança.

Anônimo,  27 de outubro de 2009 às 12:55  

Vários são os motivos de reprovaçao.
A prova é unificada, mas o valor para fazer a prova não é porque o em São Paulo o valor é de R$ 180,00 e em Rondônia o valor é de R$ 250,00. Então vamor procurar estudar muito, muito, muito porque ficar dando dinheiro para a OAB não é certeza para empregabilidade, ou fazer poupança.

Daniel,  27 de outubro de 2009 às 14:37  

Eu acredito que a geração que está chegando (faço parte dela) está ficando cada vez mais preguiçosa. A monografia não é nenhum bicho de sete cabeças, não tem nada de mais em fazer uma monografia, se a pessoa fez uma faculdade descente, não tem nada mais fácil pra ela do que escrever sobre um tema que ela mesmo escolheu. A incapacidade de escrever provêm na cultura brasileira de não ler. Quem não le, não consegue escrever e, é por isso que os novos bacharéis tanto reclamam da monografia.
Já com relação ao exame da Ordem, somente os incompetentes que não fizeram uma faculdade descente reprovam na 1a fase. Tudo que eles pedem é 50% do que foi ensinado na faculdade. Já com relação à segunda fase, a segunda de 2009 pegou pesado com a área trabalhista, mas quem disse que a vida profissional é moleza?
Quem estava preparado passou. Quem não estava, não passou.

Criticar isso é concordar com a osciosidade e preguiça que toma conta da sociedade brasileira atualmente.

Anônimo,  27 de outubro de 2009 às 18:29  

Vamos lá, o Professor André teve a cara de dizer que deu a peça de Ação de Consignação, deu o esqueleto e tudo mais, isso não é verdade, quem fez o curso sabe!!!Não procede, infelismente o FLG falhou feio, não fez essa peça, naão teve essa preocupação não, passou batido. É só pedir desculpa, tá bom!!! O restante foi bom...Não poderia ter ignorado tal pecinha, vamos esperar pra ver a grande resultado de aprovação...Só se preocuparam em RO, Contestação e RT, a coisa é séria...

Anônimo,  27 de outubro de 2009 às 20:38  

Fala sério! Eu tenho minha parcela de culpa! Eu fiz a prova de trabalhista e errei a peça. Com certeza eu deveria saber quando e como fazer uma consginação, mas esse problema não é só meu, pois eu jamais fiz uma na faculdade. Por segurança, eu fiz um cursinho, mas o professor também não tocou no assunto... E mais legal ainda é o texto do professor aí, que não chama a si a própria responsabilidade. Sim, a culpa é minha, é dos meus professores, que me ensinaram a fazer RT, RO, RR, RE, mas não me ensinaram tudo o que o Cespe poderia cobrar. Mas também vejo com maus olhos a prova. Sim!
Eu sabia que a peça não era um pedido de inquérito, mas o fiz porque não tinha tempo a perder. Achei melhor arriscar e terminar. Na prova, não temos tempo para pensar com calma, não temos todo o material desejável (que deve somar uns R$ 1.000,00) e nem sequer temos espaço para trabalhar com os livros que temos. No vestibular já não se exige do aluno que saiba as fórmulas, mas que saiba usál-las. No Exame da Ordem não é assim.
Cada aluno reprovado é mais um candidato pagante na próxima edição...
Eu concordo com a necessidade do Exame, mas este deve ser mais leal. Nós queremos nossas carteiras para advogar contra canastrões antigos e mesmo rábulas... Um sujeito que falha em três provas para juiz será o presidente do STF em cerca de cinco anos, agora, nós não podemos advogar. Quem não conhece um advogado que não sabe dar um nó decente na própria gravata? Que não sabe absolutamente nada de Português? É isso o que me chateia.

Anônimo,  28 de outubro de 2009 às 12:57  

A culpa pela reprovação em massa é única e exclusivamente das Falculdades que não ensinam coisa nenhuma (entopem a grande currucular com babozeiras e deixam o mais importante em segundo plano) e também aceitam no curso de direito qualquer um, qualquer analfabeto funcional (que é a maioria dos estudantes de direito) ingressam no curso de direito, pois o tal vertibular que as faculdades fazer é fajuto, é mera formalidade, todos que se inscrevem são aprovados. A OAB pode, querendo, muito bem acabar com o exame de ordem, é só ela mesma realizar o vestibular para infresso no curso de direito, só isso seria mais que suficiente.

Anônimo,  29 de outubro de 2009 às 14:28  

Com todo respeito ao Dr. Luiz Flavio, entendo ele ser suspeito para fazer qualquer comentário a respeito do assunto tendo em vista ser ele dono de cursinho. Faltou com a ética. Será que ele pensa ser o dono da verdade?

Monk 30 de outubro de 2009 às 18:25  

Interessante os comentários do professor Luiz Flávio

quaseadv,  1 de novembro de 2009 às 23:50  

Concordo com alguns comentários dos colegas e discordo de outros, quanto ao valor que a OAB cobra é um absurdo e nenhum deputado ou senador tem coragem de indagar e ver a justificativa de tamanha abusividade, mesmo porque não se trata de concurso e sim de uma associação ou mesmo de um emprego que foi retirado seus direitos constitucionais ao próprio (se forma mas não trabalha) só neste país capitalistas.Quanto as provas é de nivel de magistratura aplicada a bacharéis, apliquem matérias dadas em faculdades para ver onde vai o nivel de aprovados, eles não querem, o que os advogados tem que consultar lendo no seu dia a dia consultando sumulas que surgem todos os dias em rts, os bachareis tem que decorar para os exames da ordem e não simplesmente o direito que se é ensinado conforme resolução que o mec emprega, alguma coisa está errado, e tem muita gente levando o seu, caso a ser investigado.

SIL 17 de janeiro de 2010 às 14:17  

Primeiramente não poderia deixar de mostrar minha indignação ao observar que para alguns o Exame da Ordem é uma forma de " peneira" de mercado, tema que vem sendo arduamente discutido há muito, pois encontramos várias outras profissões de utilidade social até mesmo de forma direta como a medicina e no entanto não é cobrado do estudante ao seu término um Exame para que se possa exercer sua atividade. Ao meu humilde ver, a maior " peneira" existente é o próprio mercado de trabalho, o bom profissional obterá certamente muito sucesso em contra partida o profissional despreparado será automaticamente expurgado do mercado de trabalho. Pondendo assim a OAB continuar com a devida cobrança da anuidade assim como uma complementação de valores. Outro assunto que observo é a reprovação do bacharel na segunda fase do exame e este ter que novamente se submeter a primeira fase, correto seria o mesmo somente ter que se submeter a segunda fase, mesmo que houvesse um limite de tentativas para que este voltasse a primeira fase. Atenciosamente agradeço o espaço. Silvia, aluna do 5º ano do curso de Direito.

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