Opinião - Cadê a Operação "Passando a Limpo"?
quinta-feira, 22 de outubro de 2009
Por Manoel Leonilson Bezerra Rocha
Permanece na lembrança de todos nós advogados aquela impactante notícia que nos arrebatou quando deparamos com imagens nos jornais e telenoticiários em que alguns dirigentes e funcionários da atual gestão da OAB-GO, logo no raiar do dia, eram conduzidos algemados e trancafiados nos camburões das viaturas policiais por terem, segundo a Procuradoria da República e a Polícia Federal, montado um esquema para venda de carteiras de advogados em fraude contra o Exame de Ordem, com repercussão em nível nacional.
Esse episódio degradante originou-se a partir de uma longa investigação pela Polícia Federal, após diversas denúncias de pessoas honestas que não concordaram com as práticas venais de transformarem a Ordem em balcão de mercadoria através de organização criminosa instalada dentro da OAB-GO. As prisões de alguns suspeitos ocorreram logo após o período das últimas eleições para a reeleição da atual diretoria.
Quando eclodiu a operação policial, culminando com diversas prisões de pessoas da atual diretoria, com autorização judicial, alguns envolvidos no esquema fraudulento chegaram a ensaiar um boato de que tudo aquilo não passava de uma infâmia arquitetada por “intriga da oposição”. Não demorou muito para vir a público que a operação policial foi conduzida com seriedade e originada por provas robustas colhidas ao longo das investigações. Desta forma, caia por terra a tentativa dissimulada e cínica de se pretender atribuir à oposição a causa de todo aquele vexame. Não custa lembrar que durante a última campanha para a reeleição da atual gestão, uma de suas bandeiras foi a ética, a honestidade e a “continuidade dos bons resultados” de todas as gestões do grupo “OAB Forte”.
Com o estouro do escândalo e a exposição escancarada da pouca vergonha que existia por trás da cortina que encobria a fraude, inclusive com divulgação de imagens e áudio das negociatas sobre a venda de carteiras de advogados que ocorria em plena via pública, imagens que mais lembravam um camelódromo onde se negociavam a dignidade da Ordem, todos os advogados, até mesmo aqueles que se opõem ao atual (e quase eterno) grupo caudilhista, esforçaram-se para acreditar que tudo aquilo não passava de um “equívoco” e que a nossa OAB-GO não estava sendo vítima da pilhagem sistêmica; que a credibilidade e o bom nome da nossa instituição não estavam sendo jogados na lama e, quando tudo fosse esclarecido, os atuais gestores acusados daquelas condutas criminosas e imorais seriam absolvidos e, com isso, a dignidade da instituição seria restabelecida. Ledo engano! Já se passaram dois anos que eclodiu o deplorável episódio e nenhuma resposta honesta fora apresentada à sociedade e à classe dos advogados, deixando em todos apenas interrogações e uma revoltante indignação.
Desde que foram noticiadas as condutas criminosas praticadas na OAB-GO, todos nós advogados esperamos, atentos, por algum gesto de nobreza, honestidade, respeito e consideração vindo da atual diretoria no sentido de esclarecer e nos convencer de que tudo o que fora noticiado não passou de um grande equívoco. Com isso, a respeitabilidade e a honradez da instituição e dos seus atuais gestores continuam incólumes. Entretanto, outra vez, difundem informações revestidas de meias verdades no ridículo afã de fazer-nos crer que foram “inocentados” das imputações que lhes foram feitas. Ora, quando o atual presidente da OAB-GO, Miguel Cançado, difundiu aos quatro ventos que “foram absolvidos”, na verdade, ele estava se referindo apenas a uma das imputações criminosas atribuídas ao grupo criminoso, ou seja, em relação ao crime de prevaricação. Omitiu, propositalmente, que, em relação aos crimes de inserção de dados falsos em sistema de informações, previsto no Artigo 313-A do Código Penal, que ele mesmo confessou publicamente por meio da imprensa, inclusive em programa televisivo, ao vivo, formação de quadrilha ou bando, corrupção passiva, estas últimas atribuídas aos demais indiciados. Isto toda a sociedade e a classe dos advogados aguardam, há um longo tempo, por respostas sérias e honestas, sendo o mínimo que se espera do presidente de uma instituição da envergadura e do quilate da Ordem dos Advogados. Entretanto, até a presente data, não nos foram apresentadas.
Este articulista, vislumbrando o resguardo da dignidade da advocacia e a reputação da OAB-GO, solicitou ao procurador da República Helio Telho informações sobre o procedimento investigatório ao seu encargo, bem como as razões pelas quais, até hoje, decorrido tão demasiado tempo, o inquérito policial permanece em seu gabinete paralisado, sem que o mesmo ofereça denúncia ou requeira o seu arquivamento por falta de provas. A resposta, via ofício de número 4878/09, foi que o mesmo não pode fornecer informações sobre referido procedimento em razão de sua tramitação em “segredo de justiça”. Esta resposta, por ser no mínimo teratológica, não convence. Como alegar segredo de Justiça se nos autos que se encontram em trâmite na 5ª Vara Criminal Federal não faz referência a segredo de Justiça? Ainda, quem declara o “segredo de Justiça” é o juiz de Direito, não o Promotor de Justiça. Ademais, como pode, agora, alegar “segredo de justiça” depois de ampla veiculação por todos os meios de comunicação da operação policial denominada “Passando a Limpo”, inclusive com muitos dos imputados sendo algemados, presos, retirados ainda sonolentos do calor dos seus leitos para a frieza do concreto e das grades da prisão? Então, o que antes era público, estardalhaçante, é agora, de repente e estranhamente, “segredo de Justiça” e silencioso? O difuso passou a ser oculto?
Todos nós operadores do Direito sabemos que os pressupostos de uma prisão preventiva (lato sensu) são a materialidade do crime e indícios suficientes de autoria e que os supostos autores, soltos, poderiam acarretar prejuízos ao bom andamento da instrução processual penal. Então, pergunta-se: o que o procurador da República fez com a materialidade do crime e os indícios de autoria? Que fenômeno oculto e sobrenatural ocorreu para demovê-lo de toda a sua impávida convicção que possuía sobre os possíveis autores e a materialidade delitiva ao representar pela prisão temporária de meia dúzia de suspeitos? O Ministério Público, por disposição constitucional, é o titular da ação penal pública, mas não é o seu proprietário, não devendo, por isso, dela dispor, aos seus talantes, ao seu alvedrio. Desta forma, tem o dever de manifestar-se sobre os elementos trazidos ao bojo probatório, valorando-os, para oferecer a denúncia ou pleitear o seu arquivamento por falta de provas. Por sua vez, considerando a natureza do bem juridicamente tutelado, os próprios dirigentes, em um gesto de grandeza moral, deveriam instar ao Procurador da República que fosse mais diligente e célere, que cumprisse os prazos processuais e manifestasse-se sobre o procedimento que está prestes a caducar em seu poder, providência esta salutar à credibilidade do Ministério Público, da OAB-GO e ao caráter e dignidade das pessoas citadas e apontadas como criminosas, considerando que existem milhares de advogados aguardando ansiosamente por explicações. Se são inocentes, por que não processam criminalmente o delegado da Polícia Federal, o procurador da República e, inclusive, o próprio juiz federal, que ordenou as suas prisões? Se as prisões foram fundadas em materialidade delitiva, por que razão o procurador da República até hoje não ofereceu denúncia, no que pese o decurso de dois longos anos de posse dos autos? Enquanto estas iniciativas não são tomadas por aqueles que mais deveriam, resta à sociedade e a todos nós, advogados e advogadas, permanecermos em alerta para não sermos ludibriados pelo fantasma do esquecimento nem por tentativas escamoteadas de fazer-nos crer que está “tudo bem”.
Estamos às portas de uma nova eleição para a OAB-GO e, apesar de cidadãos e advogados, não nos é dado o direito à informação. Buscam, por todos os mais escusos meios, manter-nos tolhidos e à margem das respostas que tanto buscamos. Desta forma, restamos sem condições fidedignas de avaliarmos as credenciais da atual gestão, pois, como sabemos, o grupo denominado “OAB Forte” não tem este ou aquele candidato, não há desvencilhamento ou autonomia de quem quer que seja aquele que venha a encabeçar a chapa. O que há, em verdade, é um grupo coeso na defesa e manutenção dos seus interesses, estes interesses não são, necessariamente, os interesses da sociedade, nem da classe dos advogados. O candidato que se apresenta é apenas uma embalagem, um invólucro que guarnece o grupo, com seus projetos, propósitos e interesses de continuísmos perpetuados.
Manoel Leonilson Bezerra Rocha é advogado criminalista. Professor de Direito Penal e Direito Processual Penal. Doutorando em Direito Penal pela Universidade de Burgos, Espanha (mlbezerrarocha@hotmail.com)
2 comentários:
Parabéns ao professor Manoel e ao autor do blog. Mais uma matéria de peso e um chamamento à responsabilidade de cada um dos novos integrantes que irão adentrar à OAB e farão justiça, como gostaríamos que fosse feita por cada cidadão brasileiro.
Quem trabalha em Seccional só está ali para "garantir o seu" nunca vi uma seccional em que o trabalho fosse realmente voltado para o advogado e suas necessidades. Seccionais parecem muito mais um clube com balcão de negócios, quem tem alguém lá dentro tem sempre uma facilidade, já para a OAB nºXXX, pegue a fila e aguarde ou protocole seu requerimento que no prazo ainda não estabelecido o senhor poderá ser ouvido.
Postar um comentário