Impressões sobre a prova de direito civil
segunda-feira, 2 de março de 2009
Segue algumas breves considerações sobre a prova de direito civil. Não vi nenhuma controvérsia ou qualquer problema nesta prova, e acredito que nela o índice de aprovação será bem elevado.
PETIÇÃO: Gustavo ajuizou, em face de seu vizinho Leonardo, ação de indenização por dano material, em razão de ter sido atacado pelo cachorro pastor alemão de propriedade do seu vizinho. Segundo o autor, o animal, que estava desamarrado dentro do quintal do Leonardo, o atacara, provocando-lhe corte profundo na face. Em conseqüência do acorrido, Gustavo alegou ter gasto R$3 mil em hospital e R$ 2 mil em medicamentos, tendo nota fiscal do primeiro gasto e não do 2º por ter esquecido de pegar na farmácia. Leonardo, devidamente citado, apresentou contestação, alegando que o ataque ocorrera por provocação de Gustavo que jogava pedras no cachorro e acabou sendo mordido por estar sobre o muro, invadindo o terreno de Leonardo. Alegou, ainda, falta dos comprovantes dos remédios. Teve audiência de instrução e julgamento com oitiva das testemunhas que diziam que o muro de Leonardo media 1, 20m e que Gustavo realmente jogava pedras no cachorro antes do acontecido. Juiz da 40ª Vara Cível de Curitiba proferiu sentença condenando Leonardo a pagar R$5 mil de danos materiais mais R$ 6 mil de danos morais. Sentença foi publicada em 12/01/09. Após 1 semana Leonardo o procura. Elabore a peça.
Com esse dados, pode-se dizer que a peça processual cabível era uma apelação (art. 513 do CPC) que deveria ser interposta com a devida petição de interposição, para que este fizesse a admissibilidade do recurso e remetê-lo ao Tribunal de Justiça, dando-lhe os efeitos suspensivo e devolutivo. Na peça de interposição deveria também serem abordados os requisitos de admissibilidade.
Já nas razões da apelação, basicamente, o candidato deveria argumentar a existência de julgamento extra petita, porquanto o autor não fez pedido algum de indenização por danos morais em sua inicial.
Quanto ao valor atribuído aos medicamentos, esse também deve ser reformado, em razão deles não terem sido comprovados, com fulcro nos arts. 946, do Código Civil e no art. 333, I, do CPC.
O candidato ainda deveria ter argumentado que quem deu causa ao incidente fora o próprio autor, que, por imprudência e exclusiva culpa, veio a provocar o pastor alemão, colocando-se sob uma situação de risco. O Leonardo, em razão disso, não poderia ser condenado por negligência. Nesse caso, os fundamentos jurídicos estão nos arts. 936 e 945 do CC.
Aparentemente, portanto, não há nenhuma grande celeuma na peça prática de civil.
Questão 1
Proferida sentença condenatória contra banco. Parte vencedora o procura para promover cumprimento da sentença. Observa-se que esta é ilíquida e para liquidar é necessário dados que estavam em poder do banco. O que fazer?
A resposta dessa questão está no Art. 475-B, do CPC:
Art. 475-B. Quando a determinação do valor da condenação depender apenas de cálculo aritmético, o credor requererá o cumprimento da sentença, na forma do art. 475-J desta Lei, instruindo o pedido com a memória discriminada e atualizada do cálculo. (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)
§ 1o Quando a elaboração da memória do cálculo depender de dados existentes em poder do devedor ou de terceiro, o juiz, a requerimento do credor, poderá requisitá-los, fixando prazo de até trinta dias para o cumprimento da diligência.
§ 2o Se os dados não forem, injustificadamente, apresentados pelo devedor, reputar-se-ão corretos os cálculos apresentados pelo credor, e, se não o forem pelo terceiro, configurar-se-á a situação prevista no art. 362.
Questão 2
Mariana casou-se após 3 meses de namoro. Passados 4 meses da celebração do casamento, descobriu que o marido já fora condenado por lesões corporais graves contra uma ex-namorada e que ainda existem 2 ações penais em que é acusado de estupro e atentado violento ao pudor contra a ex-namorada. Mariana quer pôr fim ao casamento. Qual solução de direito material para o caso? Qual meio adequado de encaminhamento do pedido a ser realizado?
Nesse caso, deveria o candidato pleitear a anulação do casamento, em função da existência de erro essencial quanto à pessoa do outro nubente, conforme o art. 1.556 do CC concomitante ao Art. 1.557, II, também do CC.
O meio adequado seria uma ação de anulação de casamento, prevista no art. 1.560 do CC, cujo prazo prescricional é de 3 anos.
Mas antes da ação de anulação de casamento poder-se-ia requerer a prévia separação de corpos, em conformidade com o art. 1.562 do CC:
Art. 1.562. Antes de mover a ação de nulidade do casamento, a de anulação, a de separação judicial, a de divórcio direto ou a de dissolução de união estável, poderá requerer a parte, comprovando sua necessidade, a separação de corpos, que será concedida pelo juiz com a possível brevidade.
Questão 3
Rogério, por necessidade de pagar tratamento médico no exterior para seu filho, vendeu a Jorge um apartamento por R$ 200 mil. Valia, na verdade, R$400 mil. Jorge não sabia da necessidade e não se aproveitou da situação, mas Rogério, 2 meses depois, com melhora do filho, se sente prejudicado. Rogério te procura como advogado. Existe vício no negócio jurídico? Indique solução adequada para proteger interesses de Rogério.
Nesse caso, poderiam existir dois caminhos. Um seria requerer judicialmente a anulação do negócio jurídico, dada a desproporcionalidade ao valor da prestação oposta, ou se Jorge complementar o valor pago pelo imóvel para estabelecer o equilíbrio jurídico da prestação, também pela mesma desproporcionalidade. Vejamos no CC os artigos correlatos:
Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.
Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias.
Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.
§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.
§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.
Há de se ressaltar que Jorge desconhecia o problema de Rogério – a existência de premente necessidade – que não poderia ser usada como argumento-base da medida jurídica a ser tomada. Devemos lembrar que o perigo não foi causado pelo beneficiário.
Logo, a ação visando a anulação, ou a complementação do valor do apartamento, deveria ter por fundamento o enriquecimento sem causa de Jorge, tal como previsto nos Arts. 884 e 886 do CC:
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.
Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.
Questão 4
Marta, microempresária, deixou carro da confeitaria na oficina. Entre fatos que levaram a escolher aquela oficina estava a oferta de veículo para transportar os bolos que esta fazia. No curso da viagem, o condutor do veículo oferecido pela oficina, por não ter observado a distância de segurança, colidiu com a traseira do veículo da frente. Marta requereu indenização de R$ 1.500,00 ao dono da oficina em razãod a destruição dos bolos. O dono negou pagar tal valor, visto que o transporte era a título gratuito e só responde por dolo ou culpa grave, o que não era o caso, visto ser culpa leve do motorista. Marta lhe procura como advogado. Discutir o argumento do dono e indicar via judicial adequada e juízo competente para pedido de reparação de danos.
Nesse caso, seria uma ação de indenização por danos materiais, a ser processada em um Juizado Especial Civel. Por outro lado, o transporte não era a título gratuito, e sim um verdadeiro benefício indireto, parte integrante da oferta de serviço. Aplicável ao caso os arts.734 c/c 736, parágrafo único, todos do CC:
Art. 734. O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade.
Parágrafo único. É lícito ao transportador exigir a declaração do valor da bagagem a fim de fixar o limite da indenização.
Art. 736. Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia.
Parágrafo único. Não se considera gratuito o transporte quando, embora feito sem remuneração, o transportador auferir vantagens indiretas.
Afora isso, como se tratou também de uma verdadeira relação de consumo, sendo o foro da ação de competência do domicílio da consumidora.
Questão 5
Teresa fez em 10/11/08 um contrato com Artur, registrado em cartório competente, no qual prometia vender seu veículo, ano 2004, na 1ª semana de janeiro de 2009, sem estipulação de direito de retratação. Artur se interessou pelo carro porque só tinha 1000 km rodados até então. Na data avençada para cumprimento do contrato, Teresa comunicou a Artur que a promessa devia-se à sua intenção de adquirir carro novo, o que ela desistira e, por isso, o contrato estaria desfeito. Artur o procura como advogado. Identifique o negócio jurídico entre Artur e Teresa. Quais a providências a serem tomadas para cumprimento do contrato?
Verifica-se que o contrato preliminar possuía todas as características de um contato definitivo, exceto quanto à forma. Este foi entabulado obedecendo-se aos requisitos previstos na lei:
Art. 462. O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.
Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive.
Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente.
Não cumprido o contrato dentro do prazo pactuado, deve-se executá-lo para suprir a parte inadimplente, conferindo a este caráter definitivo.
Se o contrato não for executado, resolve-se em perdas e danos:
Art. 465. Se o estipulante não der execução ao contrato preliminar, poderá a outra parte considerá-lo desfeito, e pedir perdas e danos.
17 comentários:
Sobre a questão 5, eu embasei tudo no contrato preliminar, mas usei como sinonimo "promessa de compra e venda"... Sera q posso me prejudicar?
Sobre a questão dos bolos... Eu coloquei sumário, tendo em vista o dano decorrente de acidente veiculo terrestre... sera q cabe???
OLÁ,
UMA INFORMAÇÃO FORA DO TEMA..
PQ VC EXPULSOU ALGUN MEMBROS DAS COMUNIDADES DO ORKUT???
Ola Vanessa fiz igual a Voce, promessa de compra e venda. E coloquei a adjudicação compulsoria conforme preleciona a Doutrina Contrato em especie do VENOSA. E eles pediram pra identificar o contrato e depois qual tipo de ação propor, o contrato é a promessa de compra e venda, e a ação dei uma embaralhada, mas vamos ver no que dá.
acho que não cabe PROMESSA de compra e venda pq a questão diz respeito a bem móvel...
acredito que seja uma proposta de contrato de compra e venda sem clausula de retratação.
Neste caso:
Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.
Daí pode o carinha prejudicado tanto entrar direto com uma execução por titulo extra judicial como cautelar de sequestro preparando a execução...
Com relaçäo à peça, penso que a sentença era ultra (além)e näo extra (fora) petita (do pedido), havendo configuraçäode culpa concorrente (e näo exclusiva). Na questäo 3, entendo que o caso revela lesäo. Alguém mais concorda???
sim. era ultra sim. não foi diferente foi a mais!!!!
Eu coloquei ultra, tb pensava q era mais depois entendi q realmente é extra, ultra e acima do pedido, quando por exemplo vc pede 5 balas e recebe 10, extra e fora, quando vc por exemplo pede 5 balas e ganha 5 balas e 5 chicletes, como ocorreu na peça, onde o autor pediu só dano material e ganhou tb o moral, o moral estava FORA do pedido.
Sem sombra de dúvidas que era extra petita. A concessão fora fora do pedido, como bem explicou Fabi.
Anônimo, dano material é uma coisa, dano moral é outra, embora os pedidos possam ser sucessivos, porém, "in casu", não ocorreu a cumulação de pedidos, portanto o juiz não a poderia ter deferido. Acaso o MM houvesse concedido um valos superior nos danos materiais, cujo pedido foi de 5mil, aí sim, caberia classificação de sentença ultra petita.
pessoal, como a sentença foi extra petita ela não é nula?? não deveria ser pedido então a nulidade da sentença??
quanto a questao da oficina mecanica...fiz tudo certo, mas nao coloquei o foro do consumidor - nao me dei conta da relação de consumo, será que é descontado muitos pontos por causa disso, eis que haviam varias perguntas na mesma questao e essa era apenas uma delas...
Thiago acho q não, se vc respondeu as outras perguntas corretamente, eles devem te tirar alguns decimos...
A sentença extra pode ser anulada, ou reformada, colocando-a nos moldes do pedido...bom isso eu li no Nelson Nery
Eu coloquei ultra ao invés de extra...será q vou perder muitos pontos?
Colegas, respeito a opiniäo dos que entendem se tratar de extra petita, mas persisto que o caso era de ultra, julgamento laém do pedido, conforme doutrina:
A sentença extra petita segundo o nosso professor Paulo Alcântara (2004: 03) "incide em nulidade porque soluciona causa diversa da que for proposta através do pedido (...)".
Em relação a sentença ultra petita, salienta que "(...) aqui, o juiz decide o pedido, mas vai além dele, dando ao autor mais do que fora pleiteado (art. 460). A nulidade, então, é parcial, não indo além do excesso praticado, de sorte que, ao julgar o recurso da parte prejudicada, o Tribunal não anulará todo o decisório, mas apenas decotará aquilo que ultrapassou o pedido".
Este foi exatamente o ocorrido no caso.
Trago ainda um julgado:
"Se o julgamento ultra petita se resolve em excesso de valor, o Tribunal pode simplesmente reduzir o montante, em vez de anular a sentença" (TJRJ, Ac. un., 5ª C, 17.882, Ap. 22. 616, rel. Des. Barbosa Moreira, apud Alexandra de Paula, ob. cit., p. 604).
Caro amigo(a) torama q vc esteja certo (a), pq na prova eu coloquei ultra, mas continuo a achar q é extra.
Julgamento extra petita ocorre quando se julga pedido não formulado, enquanto o ultra petita tem lugar na hipótese em que se aprecia pedido formulado, porém emprestando-lhe maior extensão que a pretendida por quem o formulou
Cara, acho que era extra, porque a extra pode ser quando o juiz seleciona causa diversa da posta em juizo - natureza diversa - ou quando condena eu objeto diverso do pedido - da uma olhada no art. 460 do CPC. e ultra, como bem explicou a Faby é quando vc pede 5 e ganha 10.
Companheiros,
Escrevi em outro fórum, mas ainda não me responderam.
Tenho dúvidas se na peça coloquei o artigo pertinente a Apelação....
Em caso negativo, é possivel que minha peça seja zerada por esta omissão? Ou perderia alguns pontos no quesito fundamentação.
No mais, minha peça ficou muito boa, incluindo todos os pontos importantes do caso, com os respectivos artigos.
No aguardo.
Sds.
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