Cheque sem fundos em conta-conjunta só autoriza negativação do nome do emitente

quarta-feira, 16 de julho de 2008



O juiz da 16ª Vara Cível de Brasília determinou que o Banco do Brasil pague indenização de 7.500 reais por danos morais a uma cliente incluída no Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos – CCF. Além da indenização, o juiz deferiu liminar para que o banco exclua de imediato o nome da cliente do cadastro.

A ação foi ajuizada em 2006. Segundo a autora, primeira titular de uma conta-corrente conjunta com o marido, em 2003, o cônjuge, segundo titular, emitiu um cheque sem fundos no valor de R$ 258,56, que foi devolvido por duas vezes, com conseqüente inclusão no CCF. Afirma que foram informados antecipadamente pela instituição financeira sobre a inclusão do nome do marido no CCF, embora não tenham recebido qualquer comunicação quanto à negativação do seu nome. Alega que por esse motivo sofreu constrangimentos e ameaças na praça.

Na contestação, o banco afirmou que ambos sabiam do ocorrido e que a requerente conhecia a existência de dívida do esposo na instituição, tanto que ingressaram juntos na Justiça com ação revisional questionando o valor. Segundo o réu, a inscrição dos correntistas no CCF foi feita de acordo com as instruções do Banco Central. O banco negou, ainda, a existência de ameaças ou constrangimentos à autora e solicitou o arquivamento do processo por prescrição.

A sentença do juiz, no entanto, foi clara: “não há prescrição no caso em apreço. O conflito trazido aos autos trata de típica relação de consumo, como disposto na súmula 297 do STJ. Logo, para a pretensão de reparação dos danos causados pelo serviço aplica-se o prazo qüinqüenal, previsto pelo art. 27 do CDC.” Ainda segundo a decisão, “também não procede a alegação do banco de que por ser a requerida co-responsável pela dívida a inserção de seu nome no referido cadastro seria justificável.”

“A responsabilidade na emissão das cártulas somente pode ser imputada ao emitente e o banco possui meios de verificar quem é o responsável, por meio da conferência de assinaturas. O débito vincula-se à cártula e não ao contrato bancário entre os correntistas e a instituição financeira. Do contrário, estar-se-ia privilegiando um comportamento abusivo e ofensivo aos dispositivos do CDC que versam sobre esses bancos de dados. As informações transmitidas aos órgãos de proteção ao crédito devem ser verazes e objetivas, desprovidas de qualquer inexatidão, dúvida ou incerteza”, explica o magistrado.

Ainda cabe recurso da decisão.

Nº do processo:2006.01.1.070382-6

Autor: AF (TJDFT)

Fonte: http://www.tjdft.jus.br/imprensa/acs.htm

Vejamos o decisum:

Circunscrição : 1 - BRASILIA
Processo : 2006.01.1.070382-6
Vara : 216 - DECIMA SEXTA VARA CIVEL
Ação : Indenização
Requerente : EDNALVA MARIA DA SILVA LOPES
Requeridos : BANCO DO BRASIL S/A

S E N T E N Ç A

Cuida-se de ação de indenização por danos morais c/c antecipação de tutela, sob o rito ordinário, ajuizada por EDNALVA MARIA DA SILVA LOPES em desfavor de BANCO DO BRASIL S/A, ambos qualificados e com endereço nos autos.
(...)
É o relatório.

DECIDO.

Não havendo provas a serem produzidas, julgo antecipadamente a lide, nos moldes do permissivo legal contido no art. 330, inc. I, do Código de Processo Civil.

Cuida-se de ação ordinária, em que busca a requerente a retirada de seu nome dos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito, bem como a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos morais.

Oportuno registrar, inicialmente, a incidência das regras insertas no Código de Defesa do Consumidor ao caso em apreço, já que o conflito ora trazido aos autos trata de típica relação de consumo. Confira-se:

"PROCESSUAL CIVIL. CDC. APLICABILIDADE ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. 1 - A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras encontra-se consagrada no Enunciado 297 da Súmula de Jurisprudência do STJ. 2 - A pretensão indenizatória baseada em alegação de falha em informações prestadas pela instituição financeira, que só são repassadas aos correntistas, tem nítido contorno consumerista, pois decorre da relação jurídica pré-existente entre as partes, portanto submetida à regra prescricional contida no artigo 27 do CDC. Apelação Cível desprovida." (20050111398705APC, Relator ANGELO PASSARELI, 2ª Turma Cível, julgado em 20/02/2008, DJ 28/02/2008 p. 1816).

Rejeito a preliminar de prescrição argüida pelo requerido, uma vez que à pretensão de reparação de danos causados pelo serviço aplica-se o prazo qüinqüenal, previsto pelo art. 27 do Código de Defesa do Consumidor.

Aplicável, portanto, a inversão do ônus da prova, nos termos do disposto no inc. VIII do art. 6º, bem como no § 3º do art. 43, ambos da Lei 8078/1990, que estabelecem a obrigatoriedade de comunicação prévia do consumidor quanto à inserção de seu nome em banco de dados.

"CIVIL - DANOS MORAIS - INCRIÇÃO DO NOME DA CONSUMIDORA NO CCF (CADASTRO DE EMITENTES DE CHEQUES SEM FUNDOS) SEM PRÉVIA COMUNICAÇÃO - CHEQUE SEM PROVISÃO DE FUNDOS - OFENSA À NORMA INCRUSTADA NO PARÁGRAFO SEGUNDO DO ART. 43 DO CDC - CABIMENTO DA INDENIZAÇÃO. 1) Age em desconformidade com o CDC a empresa que não comunica previamente o consumidor sobre o envio de seu nome para o Cadastro de Emitentes de Cheques sem fundos, independentemente da condição de devedor ou não. 2) Trata-se de aviso prévio necessário à efetivação de ato que virá importar em restringir o crédito e macular o nome, muitas vezes indevidamente, razão pela qual urge dar conhecimento, antes da colocação do nome em domínio público, ao próprio interessado, possibilitando-lhe evitar a malsinada inclusão. 3) Na fixação dos danos morais, o juiz deve usar do principio da razoabilidade e arbirtrá-lo diante das circunstâncias do caso, evitando-se o enriquecimento ilícito do ofendido e servindo de admoestação ao ofensor, para que evite repetir a conduta com outras pessoas. 3) Sentença reformada para condenar-se o apelado na indenização a título de danos morais." (20010110626075ACJ, Relator JOÃO EGMONT, Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., julgado em 08/05/2002, DJ 24/05/2002 p. 86)

Com efeito, é de se notar que não foram apresentados pelo requerido documentos que comprovassem a prévia comunicação à requerida da inserção de seu nome nos cadastros do CCF. Ademais, a alegação feita pelo banco réu, quanto à ausência de comprovação em relação às ameaças e constrangimentos sofridos, não procede, pois a configuração de dano moral independe da demonstração de prejuízo, sendo suficiente a inscrição indevida nos cadastros de inadimplentes.

"AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO INDEVIDA NA SERASA. PROVA DO DANO. DESNECESSIDADE. DANOS MORAIS. VALOR DA CONDENAÇÃO. RAZOABILIDADE. I - A exigência de prova de dano moral se satisfaz com a demonstração da existência de inscrição indevida nos cadastros de inadimplentes; II - É possível a intervenção desta Corte para reduzir ou aumentar o valor indenizatório por dano moral apenas nos casos em que o quantum arbitrado pelo acórdão recorrido se mostre irrisório ou exagerado, situação que não se faz presente no caso concreto. Agravo improvido." (AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 979.810 - SP - 2007/0278694-6)"

Também não procede a alegação de que por ser a requerida co-responsável pela dívida a inserção de seu nome no referido banco de dados seria justificável. Isso porque a responsabilidade na emissão das cártulas somente pode ser imputada ao emitente e o banco possui meios de verificar quem é o responsável, por meio da conferência de assinaturas. A dívida se vincula à cártula e não ao contrato bancário firmado entre os consumidores e a instituição financeira. Do contrário, estar-se-ia privilegiando um comportamento abusivo e ofensivo aos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, que versam sobre bancos de dados e cadastros de consumidores. As informações ali contidas precisam ser verazes e objetivas, isto é, desprovidas de qualquer inexatidão, dúvida ou incerteza, inclusive quanto ao débito. A jurisprudência do e. TJDFT caminha nesse mesmo sentido, conforme se verifica pela leitura do aresto abaixo transcrito:

"CONTA BANCÁRIA CONJUNTA - CHEQUE ASSINADO POR UM DOS CORRENTISTAS - INSCRIÇÃO NO CADASTRO DE EMITENTES DE CHEQUES SEM FUNDOS. 1. Em conta bancária conjunta, o cheque assinado por um dos co-correntistas não alcança e nem compromete o outro, que só pode ser responsabilizado por título por ele subscrito. 2. Inexiste obrigação de um dos correntistas para com os títulos emitidos pelo outro. A dívida se vincula à cártula e não ao contrato bancário firmado entre os consumidores e a instituição financeira. Eventual inscrição em cadastro de emitentes de cheque sem fundo deve ocorrer apenas em nome daquele que, efetivamente, emitiu o cheque, dando causa ao ilícito. 3. Apelo improvido." (APC 2002.01.1.059586-5, Relator SANDRA DE SANTIS, 6ª Turma Cível, julgado em 07/03/2005, DJ 02/06/2005 p. 107).

Conclui-se, assim, que a providência de inscrição do nome da demandante nos órgãos de restrição ao crédito pelo banco réu operou-se ilicitamente, o que causou prejuízos em sua esfera íntima.

Sobre o dano moral causado, frise-se que este restou evidenciado pelo prejuízo que atingiu o autor, caracterizado pela inscrição indevida de seu nome junto aos órgãos de proteção ao crédito. Ressalte-se uma vez mais que, em sede de dano moral e consciente de que tal dano tem repercussão na esfera íntima da vítima , dispensa-se "qualquer exteriorização a título de prova, diante das próprias evidências fáticas." (In "Reparação Civil por Danos Morais", Carlos Alberto Bittar, 3ª ed. rev. atual. e ampl., São Paulo, Ed. RT, p. 137). Trata-se de damnum in re ipsa.

Contudo, na seara da fixação do valor da indenização devida, mister levar em consideração a gravidade do dano, o período em que o nome do autor permaneceu nos cadastros dos órgãos restritivos de crédito, o porte econômico do lesante, a quantia envolvida na espécie, além da condição da vítima. Outrossim, não se pode deixar de lado a função da reparação de dano moral, consubstanciada em impingir ao lesante uma sanção bastante a fim de que não retorne a praticar os mesmos atos. Importante também lembrar que a reparação não pode se tornar uma forma de enriquecimento sem causa.

Destarte, afigura-se razoável, suficiente e imperiosa a estipulação de indenização, a título de reparação por dano moral, no valor de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais).

Assim, configurada a ilicitude da inscrição do nome da requerente nos cadastros restritivos de crédito, a procedência da pretensão deduzida pela autora na inicial, com ressalva apenas no que toca ao valor da indenização pretendida, é medida que se impõe.

Por tais fundamentos, com espeque no art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS deduzidos na inicial para:

1) confirmar a antecipação de tutela concedida às fls. 20/21 e, de conseqüência, determinar, no que pertine à dívida oriunda do cheque nº 474996, conta nº 889082, agência 3597-1, do Banco do Brasil (fl. 12), o cancelamento definitivo da inscrição do nome da requerente dos cadastros dos órgãos restritivos de crédito;

2) condenar o requerido ao pagamento da quantia de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais), a título de indenização por danos morais, corrigida monetariamente e acrescida de juros legais moratórios a contar da publicação desta sentença;

Deixo de fixar multa diária para a hipótese de descumprimento da ordem de exclusão do nome da autora dos cadastros do CCF, uma vez que tal providência já foi adotada pelo banco requerido, conforme demonstram os documentos de fls. 45/46.

Em razão da sucumbência, condeno o requerido ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do disposto no art. 20, § 3 , do Código de Processo Civil.

Transcorrido o prazo de 15 (quinze) dias, contado do trânsito em julgado desta sentença, sem que haja o pagamento espontâneo do débito a que foi condenado o requerido, haverá incidência da multa de 10% (dez por cento), na forma do previsto pelo art. 475-J do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Oportunamente, dê-se baixa e arquivem-se os autos.

Brasília/DF, 04 de junho de 2008.

CARLOS ALBERTO MARTINS FILHO
Juiz de Direito

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