Exame de Ordem 2.2009 - Antecipação de tutela deferida em ação anulatória ajuizada na Justiça Comum

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Recebi um e-mail do Dr. Eulidio de Souza Junior ( souzaebraga@hotmail.com ) tratando de uma decisão em tutela antecipada que determinou a inscrição do autor no quadros da OAB/CE. Vejamos a decisão:

Estado do Ceará
Poder Judiciário
Comarca de Fortaleza
Fórum Clóvis Beviláqua
Juízo de Direito da 30ª Vara Cível

Processo nº 139157-31.2009.
Ação anulatória com pedido de tutela antecipada.
Autor: João Carlos Braga Leitão.
Ré: Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará.

Vistos, etc.

JOÃO CARLOS BRAGA LEITÃO, qualificada nos autos, aforou ação com pedido de tutela antecipada contra a SECCIONAL CEARÁ DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL.

Alega, em síntese, o promovente que, por força de decisão judicial prolatada por este Juízo teve deferida a sua inscrição para a 2ª fase do exame de ordem 2009.2, sendo que, por tratar-se de canditado sub judice, foi claramente prejudicado na correção da prova prático-profissional, tendo alcançado nota 5,1 (cinco vírgula um), faltando-lhe, pois, apenas 0,4 (quatro décimos) para alcançar o grau mínimo para a aprovação.

Informa ainda o promovente que, de posse da imagem digitalizada de sua prova, bem como do espelho de correção, estando completamente convicto de sua aprovação, interpôs recurso contra a malsinada correção dos textos que apresentou à banca examinadora.

Esforço debalde, prossegue o promovente, pois que, em sede de recurso, não lhe foi atribuído sequer um décimo a mais que a injusta nota que recebera na 2ª fase do certame.

No mais, traça considerações com as quais busca demonstrar injusta a pontuação a ele atribuída quando da correção da prova, inclusive em sede de recurso administrativo, apresentando comparações entre a sua prova prático-profissional e o julgamento do recuso de sua lavra com provas e recurso de outros candidatos, juntando aos autos os espelhos de tais provas, recursos e julgamentos.

Requer a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional pretendida com o fito de inscrever-se, desde logo, nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará, pois que demonstrada a verossimilhança de suas alegações e o perigo da demora da decisão judicial final da lide que ora ajuiza.

Por fim, postula pela procedência dos seus pleitos, inclusive com a ratificação da tutela de urgência que requer.

Dito isto, vou à decisão dos pleitos do ora requerente.

A princípio, cabe reafirmar a competência da Justiça Estadual Comum para processo e julgamento de causas contra as seccionais da OAB, não havendo que se falar em competência da Jusitiça Comum Federal. Assim o digo pois que, julgando a ADIN 3026/DF, proposta pelo Sr. Procurador-Geral da República, decidiu a Suprema Corte que a OAB não é pessoa jurídica de direito público, autarquia (nem mesmo de regime especial), não tendo qualquer vinculação com a administração pública indireta.

O acórdão, publicado no Diário Oficial da União de 29/09/2006, está assim ementado:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 1º DO ARTIGO 79 DA LEI N. 8.906, 2ª PARTE. "SERVIDORES" DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. PRECEITO QUE POSSIBILITA A OPÇÃO PELO REGIME CELESTISTA. COMPENSAÇÃO PELA ESCOLHA DO REGIME JURÍDICO NO MOMENTO DA APOSENTADORIA. INDENIZAÇÃO. IMPOSIÇÃO DOS DITAMES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA. CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). INEXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO PARA A ADMISSÃO DOS CONTRATADOS PELA OAB. AUTARQUIAS ESPECIAIS E AGÊNCIAS. CARÁTER JURÍDICO DA OAB. ENTIDADE PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO INDEPENDENTE. CATEGORIA ÍMPAR NO ELENCO DAS PERSONALIDADES JURÍDICAS EXISTENTES NO DIREITO BRASILEIRO. AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DA ENTIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A Lei n. 8.906, artigo 79, § 1º, possibilitou aos "servidores" da OAB, cujo regime outrora era estatutário, a opção pelo regime celetista. Compensação pela escolha: indenização a ser paga à época da aposentadoria. 2. Não procede a alegação de que a OAB sujeita-se aos ditames impostos à Administração Pública Direta e Indireta. 3. A OAB não é uma entidade da Administração Indireta da União. A Ordem é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro. 4. A OAB não está incluída na categoria na qual se inserem essas que se tem referido como "autarquias especiais" para pretender-se afirmar equivocada independência das hoje chamadas "agências". 5. Por não consubstanciar uma entidade da Administração Indireta, a OAB não está sujeita a controle da Administração, nem a qualquer das suas partes está vinculada. Essa não-vinculação é formal e materialmente necessária. 6. A OAB ocupa-se de atividades atinentes aos advogados, que exercem função constitucionalmente privilegiada, na medida em que são indispensáveis à administração da Justiça [artigo 133 da CB/88]. É entidade cuja finalidade é afeita a atribuições, interesses e seleção de advogados. Não há ordem de relação ou dependência entre a OAB e qualquer órgão público. 7. A Ordem dos Advogados do Brasil, cujas características são autonomia e independência, não pode ser tida como congênere dos demais órgãos de fiscalização profissional. A OAB não está voltada exclusivamente a finalidades corporativas. Possui finalidade institucional. 8. Embora decorra de determinação legal, o regime estatutário imposto aos empregados da OAB não é compatível com a entidade, que é autônoma e independente. 9. Improcede o pedido do requerente no sentido de que se dê interpretação conforme o artigo 37, inciso II, da Constituição do Brasil ao caput do artigo 79 da Lei n. 8.906, que determina a aplicação do regime trabalhista aos servidores da OAB. 10. Incabível a exigência de concurso público para admissão dos contratados sob o regime trabalhista pela OAB. 11. Princípio da moralidade. Ética da legalidade e moralidade. Confinamento do princípio da moralidade ao âmbito da ética da legalidade, que não pode ser ultrapassada, sob pena de dissolução do próprio sistema. Desvio de poder ou de finalidade. 12. Julgo improcedente o pedido.

Pois bem, a previsão legal referente à antecipação requerida encontra-se fixada no art. 273 do Código de Processo Civil:

"O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II- ficar caracterizado abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu".

O promovente comprovou, à evidência, que fora realmente prejudicado e preterido na correção da prova prático-profissional e no julgamento do recurso que apresentou.

Ora, não se concebe que a banca examinadora apresente julgamento aos recursos interpostos pelos canditados de forma tão díspare a ponto de majorar a nota de um deles em 3 (três) pontos e, ao mesmo tempo, não acatar sequer nenhuma das razões recursais de outro, o que se apresenta desarrazoado.

Note-se que o promovente alcançou nota bem próxima daquela exigida para a aprovação e, mesmo depois de apresentar recurso impugnando, ponto a ponto, a integralidade da correção dos quesitos da prova prático-profissional, não fora beneficiado sequer em um décimo, enquanto que candidato outro que, quando da primeira correção ficou com nota bem aquém daquela atribuída ao ora autor alcançou revisão em nada menos que 3 (três) pontos inteiros, quase dobrando a sua nota, quando se percebe, mesmo em juízo de cognição sumária, que os aspectos delineados na peça produzida por este último não atende ao que fora exigido pela própria banca examinadora.

Disso vislumbro a verossimilhança das alegações do promovente.

Nem se diga que ao Judiciário não é lícito imiscuir-se na correção de provas de concursos públicos ou certames de qualquer natureza.

Prescreve a Constituição Federal no art. 5º, inciso XXXV, com clareza solar que “ A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Colhe-se, por oportuno da jurisprudência:

PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. OAB. CRITÉRIOS DE ELABORAÇÃO CORREÇÃO DAS PROVAS DO EXAME DE ORDEM. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE, FUNDAMENTAÇÃO E MOTIVAÇÃO. ART. 5º, XXXV, DA CF/1988. POSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO PELO PODER JUDICIÁRIO./1. A vedação quanto à impossibilidade de análise dos critérios de correção de provas pelo Poder Judiciário deve ser relativizada, a fim de proporcionar ao jurisdicionado maior amplitude de proteção do seu direito./2. Para os casos em que os critérios adotados na elaboração e correção de provas de concursos estejam em clara inobservância ao princípio da razoabilidade, da fundamentação, da motivação, com base no preceito constitucional (art. 5º, XXXV, da CF), pode e deve o Poder Judiciário, com os temperamentos necessários, avaliar tais aspectos./ 3. O mérito do ato administrativo está, sim, sujeito a controle judicial, sob o critério da razoabilidade. O juiz não irá avaliar se o administrador, como é de seu dever, fez o melhor uso da competência administrativa, mas cabe-lhe ponderar se o ato conteve-se dentro de padrões médios, de limites aceitáveis, fora dos quais considera-se erro e, como tal, sujeito a anulação. (AMS 2002.34.00.035228-5/DF, relator Desembargador Federal João Batista Moreira, DJ de 25/11/2004)./4. Comprovado, no caso, que houve falha no procedimento adotado para correção da peça processual aplicada na prova prático-profissional realizada pelo impetrante, ante a inobservância aos princípios da razoabilidade, da motivação e da fundamentação, impõe-se a anulação da correção, para que nova apreciação seja realizada./5. Apelação a que se dá parcial provimento. (TRF.1- Processo: AMS 2005.34.00.020803-0/DF; APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO Órgão Julgador: OITAVA TURMA Publicação: 23/11/2007 DJ p.239 Data da Decisão: 13/11/2007 ) grifamos


“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA A MAGISTRATURA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. VEDAÇÃO EDITALÍCIA DE REVISÃO OU ARREDONDAMENTO DE NOTA. DEFERIMENTO DE PEDIDO DE REVISÃO DE PROVA A OUTROS DOIS CANDIDATOS. INDEFERIMENTO DE ARREDONDAMENTO DE NOTA FINAL DA IMPETRANTE. TRATAMENTO DESIGUAL. MALFERIMENTO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA.- 1. A Recorrente teve seu pedido de arredondamento da nota final (5,46 para 6,00) indeferido, por haver vedação expressa no Edital; dois outros candidatos, no mesmo certame, lograram obter nova pontuação por meio de revisão da correção de suas provas, hipótese igualmente vedada pelo Edital, o que lhes permitiram prosseguir no concurso. Evidência de tratamento desigual entre os candidatos, malferindo o princípio da isonomia. 2. Ressalte-se que, via de regra, não cabe ao Poder Judiciário a intervenção nos critérios de avaliação dos candidatos aos concursos públicos. Contudo, em casos como o dos presentes autos, não se pode fechar as portas da Justiça, permitindo flagrante discriminação entre os candidatos. Se, contrariando o Edital do concurso, admitiu o Tribunal a quo rever a avaliação de dois candidatos para conceder-lhes acréscimos em suas notas (para um, de 4,7 para 5,0; e, para outro, de 5,0 para 6,0), não vejo razão para negar a ora Recorrente o arredondamento de sua nota final de 5,46 para 6,00. 3. Recurso ordinário provido (STJ - RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA: RMS 15836 ES 2003/0005203-1 Relator(a): Ministra LAURITA VAZ . Julgamento: 09/02/2004. Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA . Publicação: DJ 12.04.2004 p. 221 . RSTJ vol. 186 p. 547)

O perigo da demora do provimento jurisdiconal definitivo também é manifesto.

O promovente vê-se impedido de exercer sua atividade profissional em decorrência de ato com que se entremostra ilegítimo. A discussão da causa nas vias ordinárias certamente há de demandar tempo que correrá em franco e claro prejuízo para o promovente.

Em conclusão, compulsando a documentação acostada aos autos, em especial as provas prestadas pelo promovente e também por outro candidato, os espelhos de correção fornecidos pela comissão examinadora do certame, bem como os recursos apresentados tanto pelo promovente como pelo outro canditado, e também o julgamento de tais irresignações pela banca examinadora, convenço-me da verossimilhança das alegações da parte autora. Enxergando também o perigo de sério e grave dano contra o promovente em ser, por assim dizer, subtraído, de direito consitucional seu não podendo exercer a ativdiade profissional de sua escolha, para a qual está devidamente habilitado.

Diante do exposto, com fulcro no art. 273 do CPC, defiro a tutela antecipada solicitada, determinando que a promovida efetue a inscrição do autor nos quadros da OAB/CE, deferindo-lhe o juramento de lei e de praxe, concedendo-lhe o documento indispensável ao exercício profissional de advogado.

Fica fixada multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por dia de descumprimento do preceito desta sentença.

Defiro ao autor os benefícios da Justiça gratuita.

Cite-se a promovida, na pessoa do seu representante legal, para que conteste a ação no prazo de lei.

Expediente necessários e urgentes.

Intimem-se.

Fortaleza, 17 de dezembro de 2009.

Carlos Rodrigues Feitosa
Juiz de Direito

1 comentários:

Unknown 6 de janeiro de 2010 às 10:56  

Eu fico pensando o que é a OAB afinal? E como pode usar um símbolo Nacional e ser um órgão fiscalizador de nossa profissão, já que é uma pessoa jurídica de direto privado. Pelo que entendi, ela é comparável as empresas de transportes urbanos, porque é "serviço público independente", ou seja, uma prestadora de serviço público. Estamos bem arranjados. Eu quero um Conselho Federal de Advocacia, pois a OAB como diria o Padre Quevedo: -NÃO EXISTE!

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