A eterna polêmica da atividade jurídica

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Seguindo a linha de trazer não só assuntos relacionados ao exame de ordem, mas também doutrina e assuntos de interesses gerais, escrevo hoje, a convite do colega Maurício, para os recém-advogados e bacharéis que pretendem seguir carreira, tanto na magistratura, quanto no ministério público, trazendo à baila as discussões envolvendo a atividade jurídica.

A exigência de atividade jurídica para o exercício de tais cargos surgiu a partir da Emenda Constitucional 45/04. A esse respeito diz a Constituição Federal:

“Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: 

I - ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação; 

"Art. 129.
... 
§ 3º O ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e observando-se, nas nomeações, a ordem de classificação.” 

Nesta esteira da necessidade de comprovação de atividade jurídica, tanto o Conselho Nacional de Justiça editou a resolução nº 11/2006, que em seu artigo 2º assim conceitua a atividade jurídica:

“Art. 2º: Considera-se atividade jurídica aquela exercida com exclusividade por bacharel em Direito, bem como o exercício de cargos, empregos ou funções, inclusive de magistério superior, que exija a utilização preponderante de conhecimento jurídico, vedada a contagem do estágio acadêmico ou qualquer atividade anterior à colação de grau.

Art. 3° Serão admitidos no cômputo do período de atividade jurídica os cursos de pós-graduação na área jurídica reconhecidos pelas Escolas Nacionais de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados de que tratam o artigo 105, parágrafo único, I, e o artigo 111-A, parágrafo 2º, I, da Constituição Federal, ou pelo Ministério da Educação, desde que integralmente concluídos com aprovação 

Assim, por esse conceito, não seria necessário o exercício da advocacia por três anos, mas a utilização preponderante de conhecimento jurídico, que pode ser adquirido por aqueles exercentes de cargos tais como: analista judiciário, assessores jurídicos, diretores de secretaria entre outros. Aliás, no artigo 4º da mesma resolução restou determinado que a comprovação para os ocupantes de "cargos, empregos ou funções não privativos do bacharel em Direito" deverão apresentar "certidão circunstanciada, expedida pelo órgão competente, indicando as respectivas atribuições e a prática reiterada de atos que exijam a utilização preponderante de conhecimento jurídico".

Ainda pela resolução tal comprovação deve se dar no momento da inscrição no concurso público. 

Em 2008, o Conselho Nacional do Ministério Público, editou a resolução no. 29, regulamentando o conceito de atividade jurídica em seu art. 1º:

“Considera-se atividade jurídica desempenhada exclusivamente após a obtenção do grau de bacharel em Direito, aquela exercida por ocupante de cargo, emprego ou função, inclusive de magistério superior, para cujo desempenho se faça imprescindível a conclusão do curso de direito.

Parágrafo único: Consideram-se, também, atividade jurídica, desde que integralmente concluídos com aprovação, os cursos de pós-graduação em Direito, ministrados pelas Escolas do Ministério Público, da Magistratura e da Ordem dos Advogados do Brasil, de natureza pública, fundacional ou associativa, bem como os cursos de pós graduação, reconhecidos, autorizados ou supervisionados pelo Ministério da Educação ou Órgão competente.” 

Recentemente a OAB recorreu ao Supremo Tribunal Federal (Adin 4219) para contestar resoluções do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, que regulamentam o conceito de "atividade jurídica" para fins de inscrição em concursos públicos para ingresso na magistratura e no Ministério Público, respectivamente. 

Na ação, o Conselho Federal da OAB pede a declaração de inconstitucionalidade e conseqüente afastamento do sistema jurídico do artigo 3º da Resolução 11 do CNJ, de 30 de janeiro de 2006, e do parágrafo único do artigo 1º da Resolução 29 do CNMP, de 31 de março de 2008 — que regulamentam a questão da “atividade jurídica”. 

A OAB argumenta que, de acordo com a Emenda Constituição 45, a chamada reforma do Judiciário, o ingresso nas carreiras da magistratura e do Ministério Público exige como pré-requisito, que o bacharel em Direito comprove, no mínimo, três anos de atividade jurídica. E, as resoluções do CNJ e CNMP decidem que serão admitidos para o cômputo do período de atividade jurídica os cursos de pós-graduação da área jurídica reconhecidos pelas escolas de formação de magistrados e do Ministério Público, ou reconhecidos pelo MEC.

No entendimento do da OAB, o curso de pós-graduação dessas escolas não constituem experiência ou vivência que possam ser classificadas como atividade jurídica.

Com base em pareceres dos juristas José Afonso da Silva e Walber de Moura Agra, a ADI ajuizada pelo Conselho Federal da OAB sustenta que a atividade jurídica pressupõe experiência efetiva no trato das questões nessa área e não a mera atividade econômica. Para José Afonso, a Emenda 45, "ao falar em 'bacharel em direito' e em 'atividade jurídica', mostra que outros profissionais, que não advogados, podem inscrever-se no concurso para ingresso na magistratura, desde que sejam bacharéis em direito e exerçam atividade jurídica por um período mínimo de três anos: promotores de justiça, delegados de polícia, escrivães judiciais, notários, registradores públicos". 

A integra da ação está nas paginas das seccionais, em “notícias”. 

Hugo Nigro Mazzili faz interessantes questionamentos a esse respeito: 

“O que interessa discutir é se alguma experiência jurídica anterior à obtenção do bacharelado poderia ser computada em seu favor. Durante o curso jurídico, muitas vezes, o acadêmico já se inscreve profissionalmente na OAB e faz o estágio profissional, em razão do qual pratica licitamente atos limitados de advocacia, nos termos do Estatuto da OAB. A nosso ver, isso será exercício de atividade jurídica de caráter profissional. 

Da mesma forma, entendemos que o estagiário do Ministério Público ou o estagiário da Magistratura deverá poder contar esse tempo de experiência profissional jurídica, que não se confunde com a mera formação cultural acadêmica dos bancos escolares. Além dos casos óbvios dos advogados militantes, dos promotores e juízes em exercício, que, sem dúvida, exercem “atividade jurídica”, ainda há outras hipóteses, menos óbvias, porém. O estagiário profissional, assim reconhecido pela OAB, exerce atividade jurídica? Segundo cremos, e já o antecipamos, a resposta deve ser positiva. E o estagiário acadêmico ou do Ministério Público? Por que não também? E o delegado de Polícia? Estamos certos de que sim. E o escrivão de Polícia? E o escrevente judiciário ou o oficial de Promotoria do Ministério Público, por que não?” 

Pesquisando decisões relacionadas a atividade jurídica, encontrei os votos da ADI 3460, movida pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) contra o artigo 1º da Resolução 55, de 17 de dezembro de 2004, do Conselho Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.

Essa resolução trazia a mesma exigência de três anos de atividade jurídica no momento da inscrição para o concurso, em que pese a finalidade da declaração ser diferente desta proposta pela OAB, isto porque a ADI 3460 questionava a necessidade da comprovação no momento da inscrição para o concurso pois poderia ser exigido este requisito no momento da posse. Enquanto que a ação atual, questiona a contagem dos cursos de pós-graduação como atividade jurídica. Então naquela ação (ADI 3460). a Conamp, a Constituição Federal, em seu art. 129, estabelece que o candidato, ao ingressar na carreira do Ministério Público, seja bacharel em Direito, mas não exige que ele tenha exercido atividade jurídica por três anos depois da colação de grau, como quer a resolução do MPDFT. Assim, a entidade alegava que o dispositivo da Resolução 55/04, a fim de aplicar o artigo 129, parágrafo 3º, da CF, fez restrição não prevista pela própria Constituição.

A resolução questionada, ainda conforme a associação, seria formalmente inconstitucional, tendo em vista que somente lei em sentido formal poderia restringir o livre acesso aos cargos públicos, previsto pelo artigo 37 da Constituição. Dessa forma, uma das questões levantadas pela Conamp foi saber se os requisitos da resolução deveriam ser preenchidos na inscrição para o concurso ou na posse (Artigo 129, parágrafo 3º, da Constituição Federal, e comprovada a idoneidade moral). 

Eis o voto do relator – Ministro Carlos Ayres Brito:

“Para o calendário forense não significa que o profissional do Direito atue dia-a-dia, mês-a-mês, durante 365 dias e os antigos períodos de recesso forense”, afirmou o ministro-relator Carlos Ayres Britto, em seu voto. Ele explicou ser possível que um advogado ajuíze cinco ou dez ações em um mês e nenhuma ação nos três meses seguintes. “O advogado satisfez os requisitos de experiência forense neste ano? Me parece que sim”, concluiu. Assim, o relator votou pela procedência parcial do pedido, unicamente, para excluir do parágrafo único do artigo 7º da Resolução, a expressão “verificada no momento da inscrição definitiva”.

A ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha abriu divergência e destacou três itens quanto ao objetivo da Emenda Constitucional 45/04 em relação ao debate. Em primeiro lugar, ela destacou que uma das finalidades da EC 45 seria a de ampliar a possibilidade de participação daqueles que tinham condições, mas não a aptidão para o exercício da advocacia, “pois não conseguiam comprovar a prática forense”. Ela exemplificou com os assessores de juízes, que são impedidos de se inscreverem na OAB.

O segundo ponto ressaltado pela ministra foi o de que a emenda superou o que era conhecido como juvenilização, apesar de não estar relacionado com a idade e sim com a falta de experiência para os desempenhos dos cargos públicos, especificamente em razão dos “treineiros”. A ministra explicou que os treineiros são os estudantes que fazem concurso a partir do terceiro ano para poder experimentar seus conhecimentos resolvendo as provas. “Os que passassem, se chegassem a se classificar, quando ainda não se formaram, pediam para passar para o último lugar e, se obtivesse uma liminar, começava de novo, assim, o interesse público ficava sujeito ao interesse desse candidato, agora aprovado”, observou Cármen Lúcia.

Por último, a ministra disse que com a emenda, presume-se que o candidato, na hora da inscrição, esteja habilitado para ocupar o cargo, se vier a ser aprovado para uma nomeação imediata. “Quando se abre um concurso, o poder público precisa do exercício desse cargo”, argumentou.

Quanto ao momento de se comprovar a atividade jurídica, Cármen Lúcia ressaltou que a exigência deve ser feita como estabelecido na resolução, isto é, no momento da inscrição “porque isso tanto dá segurança à sociedade, quanto dá segurança aos candidatos todos e não apenas aos interessados”. Em relação ao conceito de atividade jurídica, a ministra completou ser necessário apenas que o candidato seja bacharel, para que a partir daí sejam contados os três anos. “Quando se fala em atividade jurídica, eu penso que seja do bacharel porque, completar formalmente a qualificação, a habilitação, é importante por tudo o que se compõe na formação do bacharel, inclusive na formação ética”, disse Cármen Lúcia.

Já o ministro Eros Grau decidiu votar contra a resolução, acompanhando a jurisprudência do Supremo. Votaram no mesmo sentido os ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence. Dessa forma, por maioria, os ministros julgaram improcedente a ação.

Então se a ação proposta anteriormente foi julgada como constitucional a exigência, é bem provável que seja este o mesmo caminho a ser adotado na decisão da Adin 4219. 

Qual a sua opinião a respeito? Basta fazer a pós graduação para preencher o requisito de atividade jurídica ou é necessário que seja advogado e que atue no dia a dia, nesse período de três anos? 

Autora: Clenilda G. Barroso, Advogada, com especialização em Direito do Trabalho e Execução no Processo do Trabalho. Contabilista judicial. Ex-assessora técnica de diversos sindicatos de empregados (construção civil, vestuário, servidores do ministério da fazenda, servidores da previdência social). Ex-consultora técnica de diversas empresas e escritórios de advocacia, ligada à área de execução trabalhista. http://calculostrabalhistasgratis.blogspot.com/

4 comentários:

Marina,  13 de abril de 2009 às 19:29  

Infelizmente o resultado da OAB saiu depois da data limite, mas o concurso da defensoria Pública de Alagoas só requer inscrição na Ordem. Nem fala em prática. E o salário é melhor q em muitos estados. Tem caravanas saindo de diversas regiões. Vão acabar tendo q fazer = ao RGS: incluir histórias da farroupilha, digo, do Setão e seus heróis :) Se não, só entrará cariocas...

Danyllo 13 de abril de 2009 às 21:28  

Eu sou parcial porque estou no "período de atividade jurídica", mas sou totalmente contra a exigência de 3 anos de atividade jurídica para ingresso na magistratura ou no MP.

Primeiro porque não há qualquer prova que indique que jovens promotores ou jovens juízes seriam "piores" do que os mais velhos. Pelo contrário, o que se observa são pessoas mais focadas e, em regra, mais vocacionadas para a carreira. Se existe algum mau exemplo de juiz ou promotor unicamente pela sua jovialidade, esse fato não representaria a maioria, que é composta por ótimos juízes e ótimos promotores jovens.

Depois que é no mínimo estranho que para ser procurador do estado/município, delegado de polícia ou advogado não se necessite da prática. Ora, um delegado de policia ou um advogado são menos do que um juiz ou um promotor?

Também não está claro o que se caracteriza atividade jurídica. O estágio, afinal, serve para que mesmo? Não é, em última análise, para a pessoa ter a vivência prática da profissão que escolheu seguir?

Por fim, a exigência de três anos deixa elitizada as carreiras de juiz e promotor pois, em maioria, são candidatos que são "bancados" pelos pais esse período, e ficam somente estudando, o que lhes dá vantagem em relação àqueles que estão preocupados em trabalhar para garantir a atividade jurídica.

O assunto é controverso, e o comentário já está quase maior que o post.

Abraços e parabéns pelo blog!
Danyllo

Lênio (RS),  15 de abril de 2009 às 11:01  

Persiste ainda a questão não respondida: como ficam os membros do Poder Judiciário e do Ministério Público tidos como "incompatíveis" ao exercício da advocacia? Muitos destes, ocupantes de cargos especializados diversos da área-fim desses órgãos de modo que sua atividade não configura atividade jurídica. Além disso, também não podem exercer a advocacia, que integraria o cômputo dessa atividade. Agora a OAB deseja eliminar a única opção que resta a toda essa categoria. Que têm eles que fazer? Abrir mão de seu sustento, lançando-se em uma carreira que, em regra, não é a que almejam, para só depois de decorridos 3 anos, poderem finalmente pleitear a carreira que de fato desejam? Há razoabilidade nisso?

Anônimo,  1 de maio de 2009 às 11:44  

Existem muitos juizes que chegaram na magistratura somente com a pós-graduação e que são mais competentes que muito juizes proveniente da advocacia, aliás acho que a advocacia também tem os seus pontos negativos ,pois pode deixar um futuro juiz mais sucetiveis a parcialidades em ações criminais cujo a parte pode ser um promotor, com que teve um desafeto, assim em um momento de sentimento coorporativo ou afetivo a um advogado conhecido, poderá comprometer a parcialidade do julgamento. Além desse motivo, tem a questão de pessoas que não podem deixar de trabalharem para de dedicarem na prática jurídica.

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