Informativo de jurisprudência do STF nº 520 - 5 a 19 de setembro de 2008

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

PLENÁRIO

Venda de Combustível Adulterado e Competência da Justiça Comum

O interesse da União, para que ocorra a competência da Justiça Federal prevista no art. 109, IV, da CF, tem de ser direto e específico. Com base nesse entendimento, o Tribunal desproveu recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público Federal em que alegava que a interpretação conjunta dos incisos IV e VI do art. 109 da CF revelaria ser da Justiça Federal a competência para processar e julgar os crimes contra a ordem econômica se, independentemente de previsão da lei definidora, houvesse lesão a interesse da União. Sustentava o parquet que a comercialização de combustível fora dos padrões fixados pela Agência Nacional de Petróleo vulneraria diretamente o interesse direto dessa autarquia federal no controle, fiscalização e regulação da atividade de distribuição e revenda de derivados de petróleo e álcool. Asseverou-se que, não obstante se possa reconhecer a competência da Justiça Federal para ações penais por crimes contra a ordem econômica, nos termos do art. 109, IV, da CF, ainda que a legislação ordinária não a tenha previsto, a alegação de lesão a bens, serviços ou interesse da União ou de suas autarquias deve ser estimada perante o caso concreto — situação diversa das hipóteses declinadas no inciso VI desse dispositivo, que condiciona a competência à previsão da lei. Considerou-se que o interesse da União, no caso, seria genérico. Ressaltou-se, também, não haver se confundir o objeto de fiscalização da entidade federal com a sua atividade fiscalizatória, para assim demonstrar interesse da União ou da entidade. Precedentes citados: RE 502915/SP (DJU de 27.4.2007); ACO 1058/CE (DJE de 23.5.2008); RE 198488/SP (DJU de 11.12.98); RE 454735/SP (DJU de 18.11.2005).
RE 454737/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 18.9.2008. (RE-454737)

Vantagens Trabalhistas Posteriores ao RJU e Competência da Justiça Comum

Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar reclamação trabalhista de servidor público relativamente a vantagens trabalhistas anteriores à implantação do Regime Jurídico Único - RJU. Com base nesse entendimento, o Tribunal conheceu de conflito de competência (CF, art. 102, I, o), suscitado pelo Juiz de Direito da Vara Cível de Presidente Olegário - MG em face do TST, e, por maioria, declarou a competência do primeiro para julgar reclamação trabalhista ajuizada contra o Município de Presidente Olegário - MG em que se pleiteiam verbas decorrentes da rescisão, sem justa causa, de contrato de trabalho regido pela CLT, que dizem respeito a período posterior à instituição do RJU. Na espécie, a Junta de Conciliação e Julgamento julgara procedente a reclamação. Esta decisão fora confirmada pelo TRT da 3ª Região e transitara em julgado. Posteriormente, o referido município ajuizara ação rescisória, e, ante o julgamento de sua improcedência, interpusera recurso ordinário. O TST, declarando a incompetência da Justiça do Trabalho, dera provimento ao recurso para anular todas as decisões proferidas e determinar a remessa dos autos à Justiça Estadual. Os autos foram enviados ao Juízo de Direito da Vara de Presidente Olegário, mas o magistrado, tendo em conta que o vínculo contratual entre o reclamante e o município assumia caráter empregatício, e que o reclamante não tinha jus à estabilidade excepcional, prevista no art. 19 do ADCT/88, determinara o retorno dos autos ao TST. Este, entendendo suscitado conflito negativo de competência, enviara os autos ao STJ, que os remetera ao Supremo. Considerou-se que a transferência do regime jurídico de celetista para estatutário implica a extinção do contrato de trabalho, e que, no caso, inexiste relação de emprego sujeita à apreciação da Justiça trabalhista. Vencido o Min. Marco Aurélio que, tendo em conta que se questiona uma conseqüência do contrato de trabalho que vigorou até então, entendia ser competente a Justiça do Trabalho. Aduziu que não se estaria questionando um direito oriundo em si da nova relação jurídica, mas da pretérita, a trabalhista. Precedentes citados: CC 7027/PE (DJU de 1º.9.95); CC 7089/DF (DJU de 15.6.2004); CC 7058/MG (DJU de 20.3.2006); CC 7136/MG (DJU de 11.6.2003); AI 405416 AgR/RS (DJU de 27.2.2004); AI 198471 AgR/DF (DJU de 20.10.97).
CC 7242/MG, rel. Min. Eros Grau, 18.9.2008. (CC-7242)

REPERCUSSÃO GERAL
Fracionamento de Precatório: Custas Processuais e Requisição de Pequeno Valor

O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a possibilidade de se fracionar, ou não, o valor de precatório, em execução de sentença, com o objetivo de lograr-se o pagamento de custas processuais por meio de Requisição de Pequeno Valor - RPV. O acórdão recorrido adotara o fundamento de que é possível a expedição de RPV para pagamento das custas processuais devidas ao titular da serventia privatizada, desde que o seu crédito individual não supere o limite estabelecido pelo art. 87 do ADCT. O Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul - IPERGS, ora recorrente, alega violação aos artigos 87, I, do ADCT e 100, § 4º, da CF. O Min. Ricardo Lewandowski, relator, deu provimento recurso. Reportou-se à jurisprudência da Corte no sentido de que a execução do pagamento das verbas acessórias não é autônoma, havendo de ser considerada em conjunto com a condenação principal, em respeito ao disposto no art. 100, § 4º, da CF, que veda o fracionamento, a repartição ou a quebra do valor da execução. Em divergência, o Min. Marco Aurélio salientou que a situação concreta não se harmoniza os precedentes citados, haja vista serem diversos os titulares dos créditos em questão, e desproveu o recurso. Considerou que, no caso, a pensionista, ora recorrida, não pode executar as custas processuais por não as ter antecipado. Concluiu que não se trata de reembolso de despesas processuais e sim de pagamento ao titular do cartório. Após, pediu vista dos autos o Min. Menezes Direito.
RE 578695/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 17.9.2008. (RE-57895)

SEGUNDA TURMA

Garantia do Devido Processo: Estrangeiro Não-Residente e Reperguntas - 1

Assiste a co-réu o direito de formular reperguntas aos demais litisconsortes penais passivos em ordem a conferir real efetividade e plenitude ao direito de defesa. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu, de ofício, habeas corpus para anular — desde os interrogatórios judiciais dos demais co-réus, inclusive, realizados sem a co-participação da defesa do paciente —, processo-crime contra ele instaurado para apurar suposta prática do crime de lavagem de dinheiro no curso de contrato de financiamento mantido entre sua empresa e clube de futebol. Preliminarmente, superou-se a restrição fundada no Enunciado 691 da Súmula do STF. Reconheceu-se, em seguida, que o fato de o paciente ostentar a condição jurídica de estrangeiro (nacional russo) e de não possuir domicílio no Brasil não lhe inibe, por si só, o acesso aos instrumentos processuais de tutela da liberdade nem lhe subtrai o direito de ver respeitadas, pelo Poder Público, as prerrogativas de ordem jurídica e as garantias de índole constitucional que o ordenamento positivo brasileiro confere e assegura a qualquer pessoa que sofra persecução penal promovida pelo Estado. Nesse contexto, aduziu-se que se impõe, ao Judiciário, o dever de assegurar, mesmo ao réu estrangeiro sem domicílio no Brasil, os direitos básicos que resultam do postulado do devido processo legal, notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da ampla defesa, à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes perante o juiz natural e à garantia de imparcialidade do magistrado processante. Asseverou-se que o direito do réu à observância, pelo Estado, da garantia pertinente ao due process of law, além de traduzir expressão concreta do direito de defesa, também encontra suporte legitimador em convenções internacionais que proclamam a essencialidade dessa franquia processual, que compõe o próprio estatuto constitucional do direito de defesa, enquanto complexo de princípios e de normas que amparam qualquer acusado em sede de persecução criminal, ainda que se trate de réu estrangeiro, sem domicílio em território brasileiro, aqui processado por suposta prática de delitos a ele atribuídos.

Na seqüência, assentou-se que a magnitude do tema constitucional versado na impetração imporia algumas reflexões em torno da nova disciplina normativa a que se submete, hoje, o interrogatório, notadamente, o judicial. Ressaltou-se que, com a superveniência da Lei 10.792/2003, registraram-se significativas alterações no regime pertinente ao interrogatório, as quais refletiram a nova constituição jurídica que a CF/88 conferiu àquele que sofre persecução penal, fortalecendo as prerrogativas inerentes à garantia da plenitude de defesa, do contraditório e do tratamento paritário das partes no processo penal. Ao imputado, assegurou-se um círculo de proteção destinado a ampará-lo contra eventuais excessos e abusos cometidos por representantes do Estado, destacando-se que o réu não pode ser constrangido a confessar a prática do delito e nem a renunciar ao seu direito ao silêncio, nem auto-incriminar-se. Realçou-se, também, a relevância de se qualificar o interrogatório judicial como expressivo meio de defesa do réu, o que enseja a possibilidade de co-réu participar ativamente do interrogatório judicial dos demais litisconsortes penais passivos, traduzindo projeção concretizadora da própria garantia constitucional da plenitude de defesa, cuja integridade há de ser preservada por juízes e tribunais. No ponto, entendeu-se que eventual transgressão a tal direito subjetivo provoca nulidade absoluta dos atos processuais que se seguirem ao interrogatório judicial, em face da repercussão que deriva do desrespeito, pelo magistrado, a tão essencial franquia conferida pela própria CF. Sendo assim, determinou-se a realização de novos interrogatórios, assegurada, desde já, ao paciente, mediante regular e prévia intimação de seu advogado, a oportunidade de participação no interrogatório dos demais co-réus. Por fim, estendeu-se, de oficio, essa ordem em favor desses mesmos co-réus. Precedente citado: AP 470 AgR/MG (j. em 6.12.2007).
HC 94016/SP, rel. Min. Celso de Mello, 16.9.2008. (HC-94016)

Adequação Típica: Roubo Consumado e Homicídio Tentado

A Turma deferiu, parcialmente, habeas corpus para cassar sentença de 1º grau que condenara o paciente por latrocínio tentado (CP, art. 157, § 3º, in fine, c/c art. 14, II). Na espécie, embora consumado o roubo, da violência praticada não resultara morte, mas lesão corporal de natureza grave numa das vítimas. A defesa reiterava a alegação de que a capitulação dada ao fato seria inadequada e pleiteava, por esse motivo, o ajuste da imputação para roubo qualificado pelo resultado de lesão corporal grave (CP, art. 157, § 3º, 1ª parte). Inicialmente, adotou-se como premissa o cometimento do crime de roubo (CP, art. 157) e aduziu-se que a matéria discutida nos autos envolveria a adequação típica da conduta atribuída ao paciente. Asseverou-se que o latrocínio constitui delito complexo, em que o crime-fim é o roubo, não passando o homicídio de crime-meio. Desse modo, salientou-se que a doutrina divide-se quanto à correta tipificação dos fatos na hipótese de consumação do crime-fim (roubo) e de tentativa do crime-meio (homicídio), a saber: a) classificação como roubo qualificado pelo resultado, quando ocorra lesão corporal grave; b) classificação como latrocínio tentado; c) classificação como homicídio qualificado, na forma tentada, em concurso material com o roubo qualificado. Enfatizou-se, contudo, que tais situações seriam distintas daquela prevista no Enunciado 610 da Súmula do STF (“Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não realize o agente a subtração de bens da vítima.”) e que as decisões impugnadas aderiram à tese de que as circunstâncias dos fatos evidenciaram o animus necandi dos agentes, caracterizando, por isso, tentativa de latrocínio. Esclareceu-se, ainda, que esta Corte possui entendimento no sentido de não ser possível punição por tentativa de latrocínio, quando o homicídio não se realiza, e que é necessário o exame sobre a existência de dolo homicida do agente, para, presente esse ânimo, dar-se por caracterizado concurso material entre homicídio tentado e roubo consumado.

Tendo em conta essas balizas, observou-se que para a classificação da conduta imputada ao paciente seria preciso identificar-se a finalidade dos agentes: a) se considerado ausente o animus necandi na violência praticada, incidiria o art. 157, § 3º, 1ª parte, do CP; b) se definido que a intenção era de matar as vítimas, o tipo correspondente seria o do art. 121, § 2º, V, do CP, na forma tentada, em concurso material com o crime de roubo. Afirmou-se, entretanto, que em sede de habeas corpus não se pode discutir o alcance da prova sobre a intenção do agente. Assim, reputou-se incontroverso que, consoante admitido pelo STJ, as indicações seriam no sentido de que o dolo era de matar e não o de provocar lesão corporal. Esse o quadro, assentou-se que não restaria alternativa senão a da teórica tipificação do fato como homicídio, na forma tentada, em concurso material com o delito de roubo. Por conseguinte, ante o reconhecimento da competência do tribunal do júri, determinou-se que a ele sejam remetidos os autos, a fim de que proceda a novo julgamento, limitando eventual condenação à pena aplicada na sentença ora anulada. Por fim, estendeu-se, de oficio, essa mesma ordem aos co-réus.
HC 91585/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, 16.9.2008. (HC-91585)

1 comentários:

RENATA RODRIGUES 8 de outubro de 2008 às 18:54  

Sobre o exame de ordem, segunda fase. Em função da última grande reforma do CPP estou sem conseguir encontrar um código que apresente as modificações. Será que eles vão liberar a impressão das leis para usar na prova??? Please, preciso de ajuda. Obrigada. Renata.

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