Pedido de cumprimento de cláusulas convencionais pode ser feito em reclamação trabalhista simples

terça-feira, 22 de julho de 2008

Pelo entendimento expresso em decisão da 6ª Turma do TRT-MG, com base em voto do desembargador Ricardo Antônio Mohallem, não há nenhum impedimento legal à formulação de pedidos relativos ao cumprimento de cláusulas convencionais em simples reclamação trabalhista, ainda mais, se estas têm ligação com outros pedidos constantes da petição inicial. Assim, a Turma concluiu ser improcedente a pretensão da empresa reclamada de excluir da ação os pedidos feitos pelo sindicato dos trabalhadores, relacionados a cláusulas dos instrumentos coletivos apenas porque estes não foram formulados em ação de cumprimento.

Segundo explica o relator, não importa a denominação que o autor dá à ação. Basta a correta delimitação das partes, pedido e causas de pedir para a identificação e processamento do feito. “Pouco importa se o autor designa a ação como de cumprimento, reclamação trabalhista, etc. A moderna doutrina identifica a atual fase da evolução do direito processual brasileiro como instrumentalista, o que significa dar maior importância aos resultados do processo, e não a este propriamente dito” - ressalta.

O desembargador esclarece que a ação de cumprimento deve ser processada da mesma forma que a reclamação trabalhista, a teor dos artigos 837 e seguintes da CLT. E o artigo 872 da CLT dispõe que "(...) poderão os empregados ou seus sindicatos apresentar reclamação à Vara do Trabalho ou Juízo competente (...) quando os empregadores deixarem de satisfazer o pagamento de salários na conformidade das decisões prolatadas em dissídios coletivos".

Com base nesses fundamentos, a Turma manteve a sentença que rechaçou a alegação da empresa de ausência de pressuposto processual, entendendo presentes os requisitos para a validade e regular seguimento da ação.

Autor: TRT 3

Fonte:http://as1.trt3.jus.br/pls/noticias/no_noticias.Exibe_Noticia?p_cod_area_noticia=ACS&p_cod_noticia=1840

Vejamos parte do acórdão:

Processo : 00993-2007-135-03-00-0 RO
Data de Publicação : 12/06/2008
Órgão Julgador : Sexta Turma
Juiz Relator : Desembargador Ricardo Antonio Mohallem
Juiz Revisor : Juiz Convocado Fernando A.Viegas Peixoto
RECORRENTES: BARBOSA & MARQUES S. A. (1)
SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIAS DE ALIMENTAÇÃO DE GOVERNADOR VALADARES - SINTINA (2) RECORRIDOS: OS MESMOS

EMENTA: NOME CONFERIDO À AÇÃO NA INICIAL. DESIMPORTÂNCIA. EXTINÇÃO DE PEDIDOS, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. DESCABIMENTO. É irrelevante para o deslinde da causa o nome que lhe atribui o autor. Para o seu processamento basta a correta delimitação das partes, pedido e causa de pedir. Essa é a tese que confere maior importância aos resultados do processo, e não a este propriamente dito, o que justifica adotá-la. Não há nenhuma vedação legal à postulação de questões concernentes a cláusulas convencionais por meio de reclamação trabalhista ou ação coletiva. De outra forma, a ação de cumprimento deve ser processada nos mesmos moldes da reclamação trabalhista (arts. 837 e seguintes da CLT). O art. 872 da CLT reza que "poderão os empregados ou seus sindicatos (...) apresentar reclamação à Vara do Trabalho ou Juízo competente (...) [quando os empregadores deixarem de satisfazer o pagamento de salários na conformidade das decisões prolatadas em dissídios coletivos]". Portanto, não há amparo para extinguir, sem resolução do mérito, os pedidos relacionados a cláusulas convencionais por não terem sido formulados em ação de cumprimento.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário, oriundos da 3ª Vara do Trabalho de Governador Valadares/MG, em que figuram, como recorrentes, BARBOSA & MARQUES S. A. e SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIAS DA ALIMENTAÇÃO DE GOVERNADOR VALADARES - SINTINA, como recorridos, OS MESMOS.

RELATÓRIO

A MMª.Juíza da 3ª Vara do Trabalho de Governador Valadares/MG rejeitou a preliminar de ilegitimidade ad causam do sindicato-autor, acolheu a prescrição qüinqüenal relativamente aos substituídos Milma Ribeiro de Freitas, Nivaldo Pereira da Silva e Paulo Célio Alves, ressalvando a prescrição trintenária do FGTS, e julgou procedentes, em parte, os pedidos iniciais para: (I) condenar a ré a pagar a todos os substituídos horas extras (e reflexos) pelo labor em sobrejornada, pela ausência de concessão do intervalo intrajornada e de folga semanal, diferenças (e reflexos) de horas extras, adicional de insalubridade, horas extras noturnas, domingos trabalhados e adicional noturno, além de multas pelo descumprimento de cláusulas convencionais, e, aos substituídos Nivaldo Pereira da Silva e Paulo Célio Alves, os reflexos da parcela "Prêmio Santo Antônio"; bem como (II) (a) a anotar o labor insalubre nas CTPS's dos substituídos que trabalham ou trabalharam sob tais condições; (b) fornecendo-lhes o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP aos substituídos dispensados ou em vias de se aposentar que trabalham ou trabalharam sob condições insalubres; e (c) regularizar a concessão de folgas semanais aos substituídos (fs. 884/902).

(...)

. MÉRITO

2.1. RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ

2.1.1. Legitimidade ativa

Rejeitou-se em sentença a preliminar de ilegitimidade do sindicato-autor, ao fundamento de que os pedidos iniciais versam direitos individuais homogêneos e estão contemplados na esfera de atuação dos sindicatos pelo inc. III do art. 8º da Constituição da República.

A ré sustenta que alguns dos pedidos não têm natureza de direito individual homogêneo, pois "cada um dos substituídos encontra-se em situação diferente dos outros" (f. 912), não passando de direitos personalíssimos dos substituídos. Requer a extinção parcial do processo, sem resolução do mérito, pela falta de legitimidade ativa.

Sobre a legitimidade processual, dispõe o inc. III do art. 8º da Constituição da República que "ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas" (g. n.).

Por isso há autêntica substituição processual ex lege, por força direta e incondicionada da própria Constituição que atribui legitimidade aos sindicatos sem sujeitá-la à autorização dos interessados. O direito de o ente sindical agir em substituição processual passou a ser de natureza autônoma, precisamente porque o legitimado extraordinário atua em juízo independentemente do titular da relação jurídica de direito material.

O STF interpreta o inc. III do art. 8º da Constituição da República de forma a assegurar ao sindicato a substituição processual nas ações coletivas de defesa de direitos e interesses individuais comuns ou homogêneos dos integrantes da categoria, dispensada qualquer autorização (RR nº 214.668, Rel. Ministro Carlos Velloso, Red. Ministro Joaquim Barbosa, DJU 21.jun.2006).

Cabe aferir, portanto, se os direitos pleiteados nesta ação são individuais, pois a substituição, pela própria natureza, abrange apenas os direitos coletivos ou individuais homogêneos, isto é, aqueles que guardem repercussão no âmbito da respectiva representação.

A lei define como interesses ou direitos individuais homogêneos aqueles "decorrentes de origem comum" (inc. III, parágrafo único do art. 81 do CDC).

Segundo a doutrina, o critério que melhor elucida o significado da "origem comum" prescrita pela lei é o da similitude dos fatos que dão origem à pretensão, permitindo a análise coletivizada desta:

"A origem comum deve ser analisada no sentido de garantir a homogeneidade dos interesses, ou seja, podem ser considerados de origem comum os interesses ou direitos tanto decorrentes de um mesmo fato como de fatos apenas similares, não importa, pois o que se mostra indispensável é que os fatos, por sua simetria, determinem interesses em substância homogêneos. (...). Para admitir, contudo, o tratamento coletivizado de típicos direitos subjetivos individuais, a lei estabeleceu um requisito específico, imprescindível para assegurar a homogeneidade dos interesses, que é a formulação de pedido genérico, congruente com a sentença determinada pelo art. 95 do CDC. Destarte, a ação referente a interesses ou direitos individuais homogêneos somente tolera a feição coletiva porque a formulação de um pedido genérico permite que 'sejam desprezadas e necessariamente desconsideradas as peculiaridades agregadas à situação pessoal e diferenciada de cada consumidor, exatamente porque refogem tais aspectos da homogeneidade', na profunda observação de Arruda Alvim" (ARAÚJO FILHO, Luiz Paulo da Silva, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor - Parte processual, São Paulo, Saraiva, 2002, pp. 62/63)

Trago à baila decisão do TST com os traços delineadores ainda mais precisos sobre o direito individual homogêneo da categoria:

"ao adotar a atual redação, o inciso III do art. 8º constitucional quis restringir a legitimação à defesa dos direitos e individuais da categoria. E quais são esses direitos e interesses? São aqueles que, embora resultantes de lesões individuais, coincidem com direitos e interesses transindividuais, porque concernem a todos os membros de uma comunidade sindical. Tais interesses e direitos tanto podem ser judicialmente defendidos pelo lesado individual - eis que não se discute a sua legitimidade - como pelo sindicato, dado ao caráter transindividual dos direitos e interesses em jogo, que não atingem apenas A ou B, mas todos. A partir daí não pode mais a empresa fiar-se no princípio dispositivo da ação para perpetrar lesões. O sindicato poderá propor a ação categorial em benefício de todos, mesmo daqueles que não querem litigar, temerosos da despedida ou da futura discriminação (TST-E-RR-175.894/1995, SBDI-1, Rel. Min. Ronaldo Leal, DJ 10.10.2003). O elemento a ser examinado para identificar a legitimidade do sindicato é, portanto, a natureza homogênea do direito individual defendido. A teor do art. 81, III, da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), consideram-se direitos individuais homogêneos os decorrentes de origem comum. É essa comunidade que confere semelhança mas não igualdade aos direitos, recomendando, assim, a defesa conjunta. E mais, a homogeneidade implica, em termos processuais, que a prova a ser produzida para demonstrar o fato constitutivo do direito dos substituídos é também comum (isto é, impessoal com relação aos interessados). Como bem observa Luiz Paulo da Silva Araújo Filho: não se pode esquecer que, para os direitos individuais admitirem tratamento coletivo, é fundamental reduzi-los a um núcleo genérico e impessoal, devendo ser desprezadas e necessariamente desconsideradas as peculiaridades agregadas à situação pessoal e diferenciada de cada interessado, exatamente porque refogem tais aspectos da homogeneidade. (Tutela jurisdicional dos direitos individuais homogêneos. In: Revista Forense, vol. 360, Rio de Janeiro: Forense, 2002 (mar/abr), p. 365)" (TST, 3ª Turma, 01024-2001-099-03-00-1-RR, Red. Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJU 06.out.2006)

A postulação envolve "diferenças de horas extras, intervalos intra e intre jornadas, diferenças de horas noturnas, remuneração pelo trabalho em domingos, feriados e dias de repouso remunerado, gozo de folgas semanais, trabalho em turnos ininterruptos de revezamento, natureza jurídica do Prêmio Santo Antônio, com seus reflexos e decorrências, incluído o depósito e a multa para o FGTS, bem como a regularização da CTPS" (f. 912), de aplicação a parcela de empregados da ré (rol de substituídos indicados com a inicial), alguns dos representados pelo sindicato-autor.

A ação tem por objeto direitos de origem comum dos substituídos, sendo necessária a individuação apenas no momento de apuração do quantum devido.

O sindicato-autor detém legitimidade, não se discutindo nesta ação direitos personalíssimos, até porque o exame do pedido prescinde o de cada caso individual, circunscrevendo-se à defesa de direitos ou interesses metaindividuais dos empregados substituídos.

Rejeito.

(...)

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