Jurisprudência do STF

sexta-feira, 9 de maio de 2008


Arquivamento de Inquérito: Art. 28 do CPP e Justa Causa

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que denunciada, com terceiros, pela suposta prática do crime de homicídio qualificado reiterava as alegações de afronta ao princípio do promotor natural e falta de justa causa para o oferecimento da denúncia. Na espécie, o tribunal de origem concedera idêntica medida para determinar o trancamento da ação penal ante a inépcia da inicial acusatória. Determinado esse trancamento, a promotora de justiça da causa requerera a extinção da punibilidade dos réus e o conseqüente arquivamento dos autos.

Ocorre que o juízo de 1º grau, com base no art. 28 do CPP, ordenara a remessa do feito para o Procurador-Geral de Justiça, que designara outro membro do parquet para oferecer a denúncia em desfavor da paciente, sendo essa peça recebida. A defesa impetrara, então, habeas corpus denegado sucessivamente no tribunal de justiça local e no STJ. Inicialmente, ressaltou-se que não existiria ofensa ao princípio do promotor natural pelo fato de ter sido pedido o arquivamento dos autos do inquérito policial por um promotor de justiça e apresentação da denúncia por outro, indicado pelo Procurador-Geral de Justiça, depois de o juízo singular haver reputado improcedente o pedido de arquivamento.

Enfatizou-se que o aludido princípio do promotor natural, uma das garantias que advém do princípio do devido processo legal, é direito titularizado pelo cidadão para impedir que o Estado exorbite de suas atribuições em benefício ou em detrimento de alguém, fixando para determinada pessoa promotor ad hoc.

Considerou-se que as normas que permitiriam ao Procurador-Geral de Justiça a substituição do promotor que deveria dar continuidade ao processo (CPP, art. 28 e Lei 8.625/93, art. 10, IX, d) — se observados os critérios normais de distribuição, por outro membro do Ministério Público, designado especialmente para atuar em caso determinado —, teriam sido atendidas em sua inteireza, em observância ao princípio do promotor natural.

Relativamente à alegada ausência de justa causa para a segunda ação penal, salientou-se que o tribunal de justiça acolhera tão-somente a tese de inépcia da primeira denúncia e não a de falta de justa causa, como sustentava a impetração. Assim, incabível o trancamento da ação penal se presente na denúncia, como na hipótese, a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, e adequada indicação da conduta ilícita imputada ao réu, de modo a propiciar-lhe o pleno exercício do direito de defesa.

Vencidos os Ministros Carlos Britto e Marco Aurélio que, tendo em conta a contradição entre a ementa e a parte dispositiva do acórdão do tribunal estadual, concediam a ordem por concluir que a falta de justa causa restara proclamada, quando se condicionou o ajuizamento de ação penal futura ao levantamento de novos dados.
HC 92885/CE, rel. Min. Cármen Lúcia, 29.4.2008. (HC-92885)


Publicação em Nome de Advogado Falecido

A Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus em que condenados pelo crime de apropriação indébita (CP, art. 168, II) pleiteiam a anulação do processo a partir da publicação da pauta de julgamento de apelação criminal, sob a assertiva de cerceamento de defesa, haja vista que a pauta fora publicada em nome de advogado falecido dias antes.

A Min. Cármen Lúcia, relatora, negou provimento ao recurso por considerar que não caracteriza cerceamento de defesa o julgamento de apelação interposta em favor do réu se o seu patrono vem a falecer antes do julgamento, sem que tenha havido a oportuna comunicação desse fato à turma julgadora. Aduziu que, a teor do disposto no art. 565 do CPP, nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que tenha dado causa.

Em divergência, o Min. Marco Aurélio, assentando que ninguém pode ser julgado sem defesa (CPP, art. 261), proveu o recurso ordinário ao fundamento de se tratar de nulidade absoluta, não preclusa pelo fato de não ter sido argüida. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Carlos Britto.
RHC 93849/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 29.4.2008. (RHC-93849)


Grave Estado de Saúde e Prisão Domiciliar

Tendo em conta a excepcionalidade da situação, a Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus em que se discutia se paciente idosa (62 anos), condenada por tráfico ilícito de entorpecentes, cujo grave estado de saúde se encontrava demonstrado por diversos laudos, teria direito, ou não, à prisão domiciliar, nos termos do art. 117, da Lei de Execução Penal - LEP (“Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: I - condenado maior de 70 (setenta) anos; II - condenado acometido de doença grave; III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV - condenada gestante.”).

Asseverou-se que a transferência de condenado não sujeito a regime aberto para cumprimento da pena em regime domiciliar é medida excepcional, que se apóia no postulado da dignidade da pessoa humana, o qual representa, considerada a centralidade desse princípio essencial, significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente no país e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo.

Concluiu-se que, na espécie, impor-se-ia a concessão do benefício da prisão domiciliar para efeito de cumprimento da pena, independentemente da modalidade de regime de execução penal, pois demonstrada, mediante perícia idônea, a impossibilidade de assistência e tratamento médicos adequados no estabelecimento penitenciário em que recolhida a sentenciada, sob pena de, caso negada a transferência pretendida pelo Ministério Público Federal, ora recorrente, expor-se a condenada a risco de morte.

RHC provido para assegurar a ora paciente o direito ao cumprimento do restante de sua pena em regime de prisão domiciliar, devendo o juiz de direito da vara de execuções criminais adotar as medidas necessárias e as cautelas pertinentes ao cumprimento da presente decisão.
RHC 94358/SC, rel. Min. Celso de Mello, 29.4.2008. (RHC-94358)


Turmas Recursais e Competência em Matéria Criminal

A Turma negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia se as Turmas Recursais do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina seriam competentes para processar e julgar re¬cursos em matéria criminal, inclusive habeas corpus, em decorrência da edição de resolução daquela Corte. O recorrente alegava ofensa ao princípio do juiz natural e a configuração de juízo de exceção, haja vista a inexistência de legislação estabelecendo competência criminal àquelas turmas recursais.

Sustentava, ainda, que tais turmas possuiriam apenas competência para julgamento de recursos cíveis e que a referida resolução violaria o art. 98, I, da CF (“Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumariíssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;”).

Entendeu-se que a citada resolução do tribunal local apenas regulamentara a atuação das turmas recursais dos juizados especiais cíveis que já existiam anteriormente à Lei 9.099/95, por força da Lei Complementar estadual 77/93. Enfatizou-se que, considerando a necessidade de as causas criminais envolvendo delitos de menor potencial ofensivo ser processadas de acordo com o rito da Lei 9.099/95 e tendo em vista que não sobreviera nova lei estadual no prazo definido no art. 95 dessa mesma lei, o tribunal de justiça, observando os princípios constitucionais e legais que determinaram a criação dos juizados de pequenas causas, declarara que os juizados especiais e as turmas recursais julgariam também causas criminais, e não apenas cíveis.

Dessa forma, asseverou-se que não faria sentido exigir daquele Estado-membro outra lei para dispor sobre o que previsto na Lei 9.099/95. Concluiu-se que seria legítima, portanto, a resolução do tribunal que, pautada nos objetivos da Lei 9.099/95 e com base nos já existentes juizados especiais, regulamentou o julgamento das causas criminais por aqueles órgãos.
RE 463560/SC, rel. Min. Joaquim Barbosa, 29.4.2008. (RE-463560)


Tempestividade de Recurso e Momento de Comprovação

A Turma, por proposta do Min. Eros Grau, deliberou submeter ao Plenário julgamento de agravo regimental, do qual aquele é relator, interposto contra decisão que negara, ante sua extemporaneidade, seguimento a recurso extraordinário. Sustenta-se, na espécie, a tempestividade do recurso extraordinário sob a alegação de que, em virtude do feriado de carnaval (quarta-feira de cinzas), não houvera expediente no tribunal de origem, sendo o termo final do prazo prorrogado para o primeiro dia útil subseqüente, data em que protocolizada a petição.

Aduz o ora agravante que não juntara a resolução que “regulamentou” o aludido feriado local, quando da interposição do recurso, haja vista que publicada somente na própria terça-feira de carnaval.
RE 536881 AgR/MG, rel. Min. Eros Grau, 29.4.2008. (RE-536881)


Ação Civil Pública e Legitimidade do Ministério Público

O Ministério Público possui legitimidade para propor ação civil pública com o fim de obter certidão parcial do tempo de serviço que segurado tem averbado em seu favor. Com base nesse entendimento, a Turma negou provimento a agravo regimental em recurso extraordinário em que o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS sustentava ofensa aos artigos 127 e 129, III, da CF.

Considerou-se que o direito à certidão traduziria prerrogativa jurídica, de extração constitucional destinada a viabilizar, em favor do indivíduo ou de uma determinada coletividade (como a dos segurados do sistema de previdência social), a defesa (individual ou coletiva) de direitos ou o esclarecimento de situações, de tal modo que a injusta recusa estatal em fornecer certidões, não obstante presentes os pressupostos legitimadores dessa pretensão, autorizaria a utilização de instrumentos processuais adequados, como o mandado de segurança ou como a própria ação civil pública, esta, nos casos em que se configurasse a existência de direitos ou interesses de caráter transindividual, como os direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.

Enfatizou-se que a existência, na espécie, de interesse social relevante, amparável mediante ação civil pública, restaria ainda mais evidenciada, ante a constatação de que os direitos individuais homogêneos ora em exame estariam revestidos, por efeito de sua natureza mesma, de índole eminentemente constitucional, a legitimar desse modo, a instauração, por iniciativa do parquet, de processo coletivo destinado a viabilizar a tutela jurisdicional de tais direitos.
RE 472489 AgR/RS, rel. Min. Celso de Mello, 29.4.2008. (RE-472489)

0 comentários:

Postar um comentário

  © Blogger template The Professional Template II by Ourblogtemplates.com 2009

Back to TOP