Concessionária não consegue alterar foro para propor ação contra a Ford

terça-feira, 29 de abril de 2008

A diferença de porte entre a concessionária e fabricante de veículos não é causa para se afastar o foro eleito. Com este entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) restabeleceu decisão que considerou válida a cláusula de eleição de foro em contrato firmado entre a Ford Motor Company Brasil Ltda. e a Planalto de Automóveis S/A.

O caso trata de uma ação de cobrança movida pela concessionária Planalto, localizada em Brasília (DF), sob a alegação de que deixou de receber verbas a ela destinadas, o que levou à paralisação de suas atividades em 1998. A ação foi proposta em Brasília e não em São Bernardo do Campo (SP), foro firmado no contrato.

A fabricante contestou o foro escolhido para o oferecimento da ação (exceção de incompetência) sustentando que no contrato há a cláusula de eleição de foro e, mesmo que assim não fosse, a correta interpretação das regras de competência do Código de Defesa do Consumidor determinaria a propositura da ação no seu foro.

Além disso, afirmou que a própria concessionária já havia sustentado a validade da cláusula de eleição de foro ao propor, anteriormente, idêntica ação em São Bernardo do Campo, tendo desistido desta apenas porque lhe foi indeferido o benefício de assistência judiciária gratuita.

O pedido da Ford foi acolhido porque a concessionária não é consumidora, de forma que não se aplica o CDC à ação. Ademais, não houve demonstração da alegada hipossuficiência econômica e há prevenção do juízo de São Bernardo do Campo, devido a anterior propositura e desistência de idêntica ação.

Afastamento do foro

Inconformada, a concessionária recorreu da decisão argumentando que a hipossuficiência é completamente irrelevante. O fundamento do pedido é a dificuldade de acesso ao Judiciário, pois seus representantes precisariam se deslocar por grande distância para acompanhar os atos processuais se o processo tramitar no foro da eleição.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal, por maioria, acolheu o recurso entendendo que “afasta-se a aplicação do foro de eleição estabelecido em contrato quando uma das partes sofre considerável alteração em sua situação econômica, devendo a ação ser proposta em seu domicílio com o fim de evitar a ocorrência de prejuízos àquele que sofreu a perda aquisitiva, máxime quando o outro contratante possuir filial instalada no domicílio do hipossuficiente”.

No STJ

A relatora do recurso proposto pela Ford, no STJ, ministra Nancy Andrighi, destacou que o tribunal já pacificou jurisprudência no sentido de que, especificamente quanto à relação entre concessionária e fabricante de veículos, a diferença de porte entre as empresas não é causa para se afastar o foro eleito.

Além disso, a ministra lembrou que apenas no período entre a celebração do contrato e 1998 seria razoável falar-se em piora da saúde econômica da empresa. A partir daí, quando esta reconhecidamente encerrou suas atividades, a eventual dificuldade financeira é uma só, que perdura até hoje.

“Apesar disso, a concessionária, em uma primeira oportunidade, e, apesar de já inativa há vários anos, resolveu respeitar aquele mesmo foro contratual que, nesta ocasião, pretende tratar como impeditivo de seu acesso à justiça. Verifica-se, portanto, que o real impedimento, ao menos na visão da recorrente, à continuação da ação no foro contratual não está relacionado propriamente a este, mas sim ao indeferimento do pedido de assistência judiciária”, assinalou a ministra Nancy Andrighi.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ

Vejamos a Ementa deste acórdão:

RECURSO ESPECIAL Nº 890.417 - DF (2006/0210491-4)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : FORD MOTOR COMPANY BRASIL LTDA
ADVOGADO : JOSÉ HENRIQUE NUNES PAZ E OUTRO(S)
RECORRIDO : PLANALTO DE AUTOMÓVEIS S/A
ADVOGADO : CRISTIANO RODRIGO DEL DEBBIO E OUTRO(S)
ADVOGADA : ANGELA PAES DE BARROS DI FRANCO E OUTRO(S)

EMENTA

Processo civil. Ação de cobrança. Lide formada entre concessionária de veículos e montadora. Exceção de incompetência fundada na necessidade de respeito à cláusula de eleição de foro. Afastamento desta, pelo Tribunal de Justiça, com base na alegada perda da saúde financeira da concessionária, após a celebração do contrato. Anterior propositura, contudo, da mesma ação no foro de eleição, tendo dela desistido a autora após o indeferimento da assistência judiciária gratuita.
- Não se conhece de violação ao art. 535 do CPC quando ausentes omissão, contradição ou obscuridade no acórdão.
- A jurisprudência do STJ se orienta no sentido de considerar formalismo desnecessário o não conhecimento do agravo de instrumento interposto no Tribunal de Justiça em face da ausência
de menção expressa, na inicial, ao nome e endereço dos advogados, quando nenhum empecilho existe à plena identificação e intimação destes, com base em outros elementos do processo.
- A eventual diferença de poder econômico entre montadora e concessionária de veículos, por si só, não é suficiente para afastar a vigência de cláusula de eleição de foro no contrato. Precedentes.
- Não se sustenta, na presente hipótese, o afastamento de tal cláusula porque teria ocorrido deterioração das finanças da concessionária. Há, neste caso, particularidade fundamental: a
autora já havia proposto a mesma ação no foro de eleição, muitos anos após os fatos que ocasionaram as alegadas dificuldades financeiras, só desistindo dela em face da não concessão do
benefício da assistência judiciária gratuita.
- Assim posta a questão, nota-se que a eventual dificuldade de acesso à justiça não decorre do foro contratual, mas do indeferimento daquele benefício, o que se configura como problema jurídico próprio, a ser resolvido pelas vias adequadas.
Recurso especial provido.

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